quarta-feira, 28 de novembro de 2012

SOBRE A EDUCAÇÃO[1]

Discurso feito pelo jovem Hippolyte-Léon Denizard Rival (1804-1869)[2] “A EDUCAÇÃO moral depende de uma multidão de causas que parecem minuciosas e que no entanto têm uma grande influência, principalmente numa idade em que o caráter, semelhante à cera mole, é suscetível de receber todas as impressões. Frequentemente um vício se manifesta numa criança sem que possamos conhecer-lhe a causa; então jogamos a falta sobre a natureza, enquanto ela provém, talvez, de uma impressão que recebeu, e que se poderia ter evitado com mais precaução. Na maioria de nossas instituições, as punições que são empregadas, quase sempre muito severas, quase sempre infligidas com parcialidade e num momento de impaciência, irritam a criança; ela se revolta, se enraivece contra a autoridade, e é assim que lhe damos ocasião de ser mentirosa, colérica, desrespeitosa, insubordinada, etc.: ocasiões que poderiam ter sido evitadas. Devemos nos surpreender ao ver os jovens experimentarem desgosto por seus estudos, quando nas classes tudo respira tristeza, tudo é feito para desgostar do trabalho, eu diria mesmo para fazer odiá-lo? Com efeito, como as crianças podem amar uma coisa da qual não se lhes mostra senão o lado mais desagradável, de que se servem mesmo para as punir? Como elas poderiam amar as pessoas que estão sempre ocupadas em lhes atormentar, sob os caprichos das quais elas estão continuamente em luta? Como podem elas estimar essas pessoas, quando frequentemente vêm suas ações contrariar seus preceitos? Como podem elas se tornar justas, se se é parcial com elas? Como podem ser boas se são tratadas com crueldade? O espírito da criança, naturalmente pouco preocupado, observa todas as nuances, mesmo as mais delicadas, do caráter do seu mestre e sabe aproveitá-las com habilidade. Eu vi uma criança de dez anos empregar a bajulação com tanta arte, quanto o mais hábil cortesão. O caráter frágil de um mestre a havia feito tal. Eis como havia cumprido sua tarefa de professor, sem ter, no entanto, a mínima má intenção. Toda prudência se faz necessária quanto à conduta que temos diante das crianças, pois facilmente criamos nelas uma boa ou má impressão. Tudo, até o próprio tom com que lhes falamos, em certas circunstâncias, pode influenciá-las. Deve causar surpresa o fato de nelas se desenvolverem vícios dos quais se ignora a fonte? Uma criança pode se tornar afável com homens que se deixam dominar por suas paixões? Pode adquirir sentimentos nobres com almas vis? Pode aprender a ser boa com aqueles que a maltratam? Pode se tornar polida com um homem que não o é? Pode, em uma palavra, adquirir as virtudes sociais com aquele que não as possui? Sem falar dos vícios mais palpáveis, estão aí uma série de observações minuciosas que contribuem essencialmente para a formação do moral da criança. São essas atenções que se negligencia na maioria das instituições, e outras bem maiores, as quais se pode perceber sem esforços. Mas, dir-se-á, qual é o homem bastante paciente para entrar nesses pequenos detalhes? Quem é que tem suficiente império sobre si mesmo, para atentar sobre suas pequenas falas, sobre suas mínimas ações? Quem é que sacrificará, por assim dizer, sua existência, para não se ocupar senão em ser útil a seu aluno? Esse homem seria o ser por excelência. Eu respondo: O professor, tal como eu o entendo, e não um mercenário cujo objetivo é ganhar dinheiro, e que sacrifica tudo ao seu próprio interesse. A reunião de todas essas qualidades no mesmo indivíduo é difícil, eu o confesso; mas se ele não pode aspirar à perfeição, deve tratar de, pelo menos, dela se aproximar o máximo possível. A obrigação que um professor se impõe é bem difícil de preencher, é uma obrigação sagrada quando se quer fazer honrado. Alguém me perguntou um dia se existe um homem, tal como o que acabo de descrever, e se esse não seria um ser quimérico para o nosso século; pois eu não conheço, dizia ele, ninguém que não seja dominado por um espírito de interesse e de egoísmo, mesmo aqueles que querem parecer filantropos. Respondi que não censurava que se tivesse em vista um pouco o seu interesse, nessa parte, porque cada um deve assegurar seus meios de existência; mas que se faça disso um ramo de comércio, uma especulação; que se sacrifique o interesse (físico, moral ou intelectual) de seus alunos ao seu próprio interesse, eis o que censuro. Existem, no entanto, homens como os que descrevi, mesmo em nosso século; existem poucos, é verdade, mas é o que os torna ainda mais estimáveis. Provavelmente terei oportunidade de voltar a falar sobre este artigo, e aí darei a conhecer alguns desse homens." ________________________________________ [1] Le Petit Album de la jeunesse, par Alexandre de Villiers. Paris, 1825. Traduzido do francês pela Equipe do IPEAK. [2] Diretor de escola, membro da Academia da indústria, da Sociedade Universal de Estatística, do Instituto Histórico, da Sociedade gramatical, da Sociedade de Métodos, Correspondente da Sociedade de Emulação de Ain, etc. etc. Em 18 de abril de 1857, Hippolyte assume o pseudônimo de Allan Kardec, ao publicar o primeiro livro da Ciência Espírita, intitulado Livro dos Espíritos.

sábado, 24 de novembro de 2012

Por Que Não Seguimos o Exemplo De Kardec

O pesquisador Crysantho de Abreu, em seu livro "Allan Kardec e o Espiritismo" diz: "Há duas fases na vida de Allan Kardec:—uma anterior à constituição do Espiritismo, mais material, conquanto superior na ordem moral, outra inteiramente espiritual, que, admitindo e aceitando a doutrina nascente, faz dela a preocupação constante do resto de sua vida." Todas as qualidades morais, que concorrem para mar o homem de bem, foram logo desabrochando no jovem Hipólite Rivail e constituíram sempre o fundo do seu caráter. "Quando apareceu depois o grande movimento espírita de que foi diretor, era já um homem experimentado nas lidas da vida, contando já mais de cinqüenta anos, mas sendo guiado por uma consciência reta”. O Espiritismo não lhe trazer a transformação súbita do caráter. Não veio modificá-lo de chofre, dando-lhe imediatamente qualidades que possuía. Já o encontrou formado. Apenas o lapidou. Era já um espírito evoluído, com um longo tirocínio de outras existências e de outras missões, perfeitamente aparelhado, por. tanto, para desempenhar a nova missão que trazia. "Na vida a coragem nunca lhe faltou. Ele não desanimava nunca. A calma foi sempre uma das feições mais salientes do seu caráter. Ficando logo arruinado, perdendo toda sua pequena fortuna no começo da vida, sempre exercitou a caridade, e já casado com a mulher que foi depois, incansável na propaganda de suas idéias, ele consegue, por meio de um obstinado labor, readquiri-la quase toda no ensino, escrevendo ao mesmo tempo trabalhos didáticos, fazendo traduções de obras estrangeiras, ou preparando a escrituração de estabelecimentos comerciais.” Kardec se notabilizou, entre outras coisas, por seu espírito democrático, pelo defender o livre-pensar, por manter o respeito pelos interlocutores, mesmo quando discordava em defesa da doutrina, mas sempre respeitando todas as crenças e nunca fez nada que o desabonasse e nem a doutrina Mas, eis que de repente, quisemos ser mais Kardecs do que o próprio Kardec, quisemos ser mais reis do que o rei, quando o próprio rei foi humilde o tempo todo, no tratar e no ensinar. Fazendo uma metáfora é como se fossemos alunos incipientes do curso de Mestrado e Kardec já tivesse pós-Graduação em Doutorado. E ser Doutor significa dominar a matéria, enquanto que ser mestre significa estar apto a ensinar a matéria, mas nós somos ainda, alunos do Mestrado, ou seja, aqueles que ainda estão aprendendo para poder ensinar um dia, mas que ainda não são Mestres e muito menos Doutores em Espiritismo. Abaixo trago uma frase de Kardec, aquele a quem dizemos seguir em termos de espiritismo, quer pelo crivo da razão, que ele recomendou que passássemos tudo, quer pelo bom senso, mas nos esquecemos das aulas dele e só repetimos o que ele falou, mas não fazemos o que ele fez, pois so aprendemos o que nos interessa. Sei que alguns dirão que o livro de onde foi tirada a frase de Kardec (Obras Póstumas) não é doutrinário, por não ser Obra Básica, mas fazendo uma outra metáfora direi: - É como se Kardec fosse o Mestre-Cuca e as obras dele sobre espiritismo (incluindo as básicas) fossem os Livros de Receitas. Afinal, o Mestre-Cuca não tem autoridade para falar de suas receitas? Por que essa mania de querer saber mais do que Kardec e querer tomar dele as rédeas do que ele falou? Segue o Trecho (leiam com atenção e discordem de Kardec – se puderem): "A tolerância, sendo uma conseqüência da moral espírita, impõe-nos o dever de respeitar todas as crenças. Não se atirando pedras em ninguém, desaparece o pretexto das represálias, ficando os dissidentes com a responsabilidade de suas palavras e de seus atos. Se eu tiver razão os outros acabarão por pensar como eu, se eu não tiver razão, acabarei por pensar como os outros." Por Que Não Seguimos o Exemplo De Kardec e Em Vez Disso, Insistimos Em Ser Mais Kardecs Do Que Kardec?

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Os dois Voltaires

(Sociedade Espírita de Paris, grupo Faucherand - Médium: Sr. E. Vézy) (Revista Espírita, maio de 1862) Sou eu mesmo, mas não aquele Espírito trocista e cáustico de outrora. O reizinho do século dezoito, que dominava pelo pensamento e pelo gênio a tantos soberanos, hoje não mais tem nos lábios aquele sorriso mordaz, que fazia tremer os inimigos e os próprios amigos! Meu cinismo desapareceu diante da revelação das grandes coisas que eu tinha pretensão de saber, mas que só conheci no além-túmulo! Pobres cérebros demasiado estreitos para conterem tantas maravilhas! Humanos, calai-vos e humilhai-vos ante o poder supremo! Admirai e contemplai! É o que podeis fazer. Como quereis aprofundar Deus e o seu grande trabalho? Apesar de todos os seus recursos, a vossa razão não se quebra diante do átomo e do grão de areia que ela não pode definir? Eu empreguei a minha vida a procurar e conhecer Deus e seu princípio. Minha razão se enfraqueceu e eu cheguei ao ponto não de negar Deus, mas a sua glória, o seu poder e a sua grandeza. Eu o explicava desenvolvendo-se no tempo. Uma intuição celeste me dizia que rejeitasse tal erro, mas eu não escutava e me fiz apóstolo de uma doutrina mentirosa... Sabeis por quê? Porque, no tumulto e na confusão de meus pensamentos, num entrechoque incessante, eu só via uma coisa: meu nome gravado no frontão do templo da memória das nações! Eu só via a glória que me prometia essa juventude universal que me cercava e parecia saborear com suave delícia a essência da doutrina que eu lhe ensinava. Entretanto, empurrado não sei por qual remorso de minha consciência, quis parar, mas era tarde. Como toda utopia, todo sistema que abraçamos nos arrasta. A princípio segue a torrente, depois nos arrasta e nos quebra, tão rápida e violenta é por vezes a sua queda. Crede-me, vós que aqui estais à procura da verdade, encontrá-la-eis quando tiverdes tirado de vosso coração o amor às lantejoulas, que um tolo amor-próprio e um tolo orgulho fazem brilhar aos vossos olhos. Na nova via por onde marchais, não temais combater o erro e desafiá-lo, quando se erguer à vossa frente. Não é uma monstruosidade preconizarmos uma mentira, contra a qual ninguém ousa defender-se, pelo fato de saber-se que fizemos discípulos que ultrapassaram as nossas crenças? Vedes, meus amigos, que o Voltaire de hoje não é mais aquele do século dezoito. Eu sou mais cristão, porque aqui venho fazer-vos esquecer a minha glória e vos lembrar o que eu fui na juventude e o que eu amava em minha infância. Oh! Como eu gostava de me perder no mundo dos pensamentos! Minha imaginação ardente e viva percorria os vales da Ásia em busca daquele que chamais Redentor... Eu gostava de percorrer os caminhos que ele tinha percorrido. E como me parecia grande e sublime esse Cristo em meio à multidão! Eu acreditava ouvir a sua voz poderosa, instruindo os povos da Galileia, das bordas do Tiberíades e da Judeia!... Mais tarde, nas minhas noites de insônia, quantas vezes me ergui para abrir uma velha Bíblia e reler suas páginas santas! Então minha fronte se inclinava diante da cruz, esse sinal eterno da redenção, que une a Terra ao Céu, a criatura ao Criador!... Quantas vezes admirei esse poder de Deus, subdividindo-se, por assim dizer, e cuja centelha se encarna para fazer-se tão pequena, vindo entregar a alma no Calvário, em expiação!...vítima augusta cuja divindade eu negava, e que, entretanto, me fez dizer: Teu Deus que tu traíste, teu Deus que tu blasfemas; Para ti, para o Universo, Morreu nesses lugares! Sofro, mas expio a resistência que opunha a Deus. Eu tinha a missão de instruir e esclarecer. A princípio o fiz, mas o meu facho se extinguiu nas minhas mãos, na hora marcada para a luz. Felizes filhos do século dezenove e do século vinte, a vós é que é dado ver luzir o facho da verdade. Fazei que vossos olhos vejam bem a sua luz, porque para vós ela terá radiações celestes, e sua claridade será divina! VOLTAIRE Filhos, deixei que em meu lugar falasse um dos vossos grandes filósofos, principal chefe do erro. Quis que ele viesse dizer-vos onde está a luz. Que vos parece? Todos virão repetir-vos: “Não há sabedoria sem amor nem caridade”. Dizei-me, que doutrina será mais suave para ensinar que o Espiritismo? Nunca seria demasiado repetir-vos que o amor e a caridade são as duas virtudes supremas que unem, como diz Voltaire, a criatura ao Criador. Oh! Que mistério e que laço sublime! Ínfimo verme da Terra, que pode tornar-se tão poderoso que a sua glória atingirá o trono do Eterno!... SANTO AGOSTINHO

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Brasil um país de dependentes...!

O brasileiro ultimamente vêm demonstrando uma falta de amadurecimento político, uma insegurança e ao mesmo tempo uma dependência do outro... Esse outro está cada vez mais próximo de si mesmo. Buscam heróis constantemente para salvaguardar-se de alguma iniquidade cometida. Se não vejamos: bastou o ministro Joaquim Barbosa cumprir a Lei (com relação ao caso do mensalão), que alguns já os indicam par a presidente da República nas próximas eleições. Não é porque o ministro é negro, e condenou os réus do mensalão, que deve ser comparado a um herói capaz de "salvar" o Brasil? Aliás, gostaria de saber qual o motivo de tanta dependência e necessidade? O mundo sempre passou por períodos de turbulências, sejam elas físicas, ecológicas, financeiras e sociais (com uma ressalva no que diz respeito ao problema do desmatamento...). Na verdade, existe uma falta de preparo psicológico nas pessoas, justamente pela má educação recebida... O povo vive numa dependência religiosa a tal ponto, que precisa constantemente de "milagres" - Vejam a música mais cantada ultimamente por algumas comunidades religiosas! "... eu preciso de um milagre...". Barak Obama e Joaquim Barbosa já foram até comparados com Martin Luther King. Afinal, o que é preciso para que o brasileiro acorde para obter uma consciência universal da vida?

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Ponto de Mutação: A Visão Espírita

VIVA JESUS! Boa-tarde! queridos irmãos. Ponto de Mutação: A Visão Espírita 1. Um exame da atual experiência humana leva, inexoravelmente, à constatação de que ela vive uma de suas fases mais contraditórias, em que os extremos atingiram limites nunca antes alcançados. Jamais o progresso científico e o avanço tecnológico foram tão vertiginosos, como o observado nos últimos cem anos. Todavia, quanto ao aspecto moral, o homem não conseguiu caminhar no mesmo ritmo. Daí a razão por que os cientistas sociais são unânimes em reconhecer que o final do século passado e o início do atual constituem mais um ponto de mutação da Humanidade, cuja principal característica será a implantação de uma nova consciência, conforme acentua Leonardo Boff, em seu livro Feminino e Masculino, Uma nova consciência para o encontro das diferenças[1], escrito a quatro mãos com Rose Marie Muraro. De acordo com eles, “... é só recentemente, no final do século XX e no início do século XXI que podemos falar realmente da emergência de uma nova consciência. A aceleração histórica e a tecnologia se tornaram incontroláveis e imprevisíveis. Mais de 90% de todas as grandes invenções foram feitas nos últimos cem anos. Assim, a humanidade caminhou de uma lenta escalada para uma aceleração explosiva, principalmente depois da invenção das tecnologias eletrônicas, das quais a mais importante é a do computador, que dá início à Segunda revolução Industrial. Estamos vivendo, portanto, mais um “ponto de mutação” da nossa espécie, criador de uma nova consciência das novas estruturas humanas. Só que este é, talvez, o mais profundo de todos, tão radical quanto aquele que nos transformou de animais em seres humanos: nos primórdios integrados à natureza, os seres humanos também integrados entre si”. 2. Fritjof Capra[2] sustenta que a revolução da física moderna prenuncia uma revolução iminente em todas as ciências e uma transformação da nossa visão do mundo e dos nossos valores. Entende, também, que os movimentos sociais dos anos sessenta e setenta (o livro aqui citado foi escrito em 1981) representam uma nova cultura em ascensão, que, fatalmente, irá substituir as instituições vigentes, reconhecidamente obsoletas. O seu raciocínio se apoia nas tradições místicas orientais, com especial destaque para o I Ching, cujas palavras são utilizadas na abertura da referida obra: “O término de um período de decadência sobrevém do ponto de mutação. A luz poderosa que fora banida ressurge. Há movimento, mas este não é gerado pela força... O movimento é natural, surge espontaneamente. Por essa razão, a transformação do antigo torna-se fácil. O velho é descartado, e o novo é introduzido. Ambas as medidas se harmonizam com o tempo, não resultando daí, portanto, nenhum dano” (op. cit, s/n). 3. Essas opiniões, confrontadas com a realidade, dão a impressão de que não passam de utópicas esperanças de seus autores, e que é quase impossível alimentar qualquer expectativa mais otimista quanto ao futuro da Humanidade. A agressividade, tanto individual como coletiva, vem alarmando as autoridades das diferentes nações e os órgãos internacionais incumbidos de zelar pela paz mundial. A tecnologia a serviço do crime e da guerra dá uma dimensão exata dessa “era de perplexidades e contradições”, em que a fome e a miséria convivem no mesmo espaço com a fartura e a riqueza, o lixo com o luxo, a doença com a saúde, a guerra com a paz! As pesquisas de Erich Hobsbawm[3], professor aposentado do Birkbeck College da Universidade de Londres e, atualmente lecionando na New School for Social Research, de Nova York, concluem que, no século XX, mataram-se mais seres humanos do que em qualquer outra época. Mas, contraditoriamente, tais pesquisas apontam, também, que nunca se chegou a níveis de bem-estar e a transformações iguais aos observados nesse período. 4. Quem conhece a obra de Kardec não se espanta nem se admira diante dessa realidade. Em A GÊNESE, ele é por demais explicito ao afirmar que uma nova geração virá substituir aquela já velha e carcomida que ainda ocupava – e ocupa – seu lugar no mundo, o que implicará, necessariamente, uma série de sacudidelas no planeta. Adverte, porém, que tais sacudidelas não serão caracterizadas por grandes hecatombes de natureza física, porquanto ocorrerão no interior da própria Humanidade, cujas entranhas serão seriamente abaladas: “Hoje, já não são mais as entranhas do planeta que se agitam: são as da Humanidade” (p. 405). Publicada em janeiro de l868, encerra uma autêntica profecia em relação a todos os acontecimentos que ocorrem atualmente na Terra. No Capítulo XVIII, o Codificador faz uma síntese magistral da situação da Terra neste início de um novo ciclo. Tomando como ponto de referência a Lei do Progresso, ele destaca o duplo aspecto da evolução planetária, o físico e o moral, o que conduzirá à depuração dos Espíritos encarnados e desencarnados que povoam a Terra. Enquanto a primeira se realiza de forma brusca e caracterizada por impressões muito acentuadas, a outra segue um ritmo lento, gradual e insensível. Daí a razão da distância que ainda separa as duas formas de evolução. 5. O “ponto de mutação” dos filósofos e sociólogos, com todas as consequências que as grandes transformações sempre provocaram, está definido de uma maneira clara e incontestável no seguinte trecho da referida obra: “A Humanidade tem realizado, até ao presente, incontestáveis progressos. Os homens, com a sua inteligência, chegaram a resultados que jamais haviam alcançado, sob o ponto de vista das ciências, das artes e do bem-estar material. Resta-lhe ainda um imenso progresso a realizar: o de fazerem que entre si reinem a caridade, a fraternidade, a solidariedade, que lhes assegurem o bem-estar moral. Não poderiam consegui-lo nem com as suas crenças, nem com as suas instituições antiquadas, estos de outra idade, boas para certa época, suficientes para um estado transitório, mas que, havendo dado tudo o que comportavam, seriam hoje um entrave. Já não é somente de desenvolver a inteligência o de que os homens necessitam, mas de elevar o sentimento e, para isso, faz-se preciso destruir tudo o que superexcite neles o egoísmo e o orgulho” (p. 404). José Carlos Monteiro de Moura ________________________________________ [1] Boff, Leonardo e Muraro, Rose Marie – FEMININO E MASCULINO, Editora Sextante, Rio, 2002, pp 10 e 11. [2] Capra, Fritjof – O PONTO DE MUTAÇÃO, Editora Cultrix, 1987. [3] Hobsbawm – ERA DOS EXTREMOS – O breve século XX – 1914-1991 Cia. das Letras, São Paulo, 2003. [4] O HOMEM INTEGRAL, psicografia de Divaldo Pereira Franco, Livraria Espírita Alvorada – Editora, Salvador, Bahia, 1991, p. 60. Clique aqui para ler mais: http://www.forumespirita.net/fe/accao-do-dia/ponto-de-mutacao-a-visao-espirita-44903/#ixzz2BkriXS4Z

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

O ESPIRITISMO SEM OS ESPÍRITOS

O ESPIRITISMO SEM OS ESPÍRITOS (Revista Espírita, abril de 1866) Ultimamente vimos uma seita tentar se formar, arvorando como bandeira a negação da prece. Acolhida inicialmente por um sentimento geral de reprovação, não vingou. Os homens e os Espíritos se uniram para repelir uma doutrina que era, ao mesmo tempo, uma ingratidão e uma revolta contra a Providência. Isto não era difícil porque, chocando o sentimento íntimo da imensa maioria, ela carregava em si o seu princípio destruidor. (Revista de janeiro de 1866). Eis agora uma outra que se ensaia num novo terreno. Tem por divisa: Nada de comunicações dos Espíritos. É muito singular que esta opinião seja preconizada por alguns daqueles que outrora exaltavam a importância e a sublimidade dos ensinamentos espíritas e que se gloriavam do que eles próprios recebiam como médiuns. Terá ela mais chance de sucesso que a precedente? É isto que vamos examinar em poucas palavras. Essa doutrina, se podemos dar tal nome a uma opinião restrita a algumas pessoas, se fundamenta nos dados seguintes: “Os Espíritos que se comunicam não são senão Espíritos ordinários que até hoje não nos ensinaram nenhuma verdade nova, e que provam a sua incapacidade, não saindo das banalidades da moral. O critério que pretendem estabelecer sobre a concordância de seu ensino é ilusório, por força de sua insuficiência. É ao homem que cabe sondar os grandes mistérios da Natureza e submeter o que eles dizem ao controle de sua própria razão. Nada nos ensinando as suas comunicações, nós as proscrevemos de nossas reuniões. Discutiremos entre nós; buscaremos e decidiremos, em nossa sabedoria, os princípios que devem ser aceitos ou rejeitados, sem recorrer ao assentimento dos Espíritos.” Notemos que não se trata de negar o fato das manifestações, mas de estabelecer a superioridade do julgamento do homem, ou de alguns homens, sobre o dos Espíritos; numa palavra, de separar o Espiritismo do ensino dos Espíritos, pois as instruções destes últimos estariam abaixo do que pode a inteligência dos homens. Essa doutrina conduz a uma singular consequência, que não daria uma alta ideia da superioridade da lógica do homem sobre a dos Espíritos. Graças a estes últimos, sabemos que os da ordem mais elevada pertenceram à Humanidade corporal que eles ultrapassaram há muito tempo, como o general ultrapassou a classe do soldado da qual ele saiu. Sem os Espíritos, ainda estaríamos na crença de que os anjos são criaturas privilegiadas e os demônios criaturas predestinadas ao mal para a eternidade. “Não, dirão, porque houve homens que combateram essa ideia.” Que seja, mas quem eram esses homens senão Espíritos encarnados? Que influência teve a sua opinião isolada sobre a crença das massas? Perguntai ao primeiro que chegar se conhece ao menos de nome a maioria desses grandes filósofos? Ao passo que vindo os Espíritos a todos os cantos da Terra manifestar-se ao mais humilde como ao mais poderoso, a verdade propagou-se com a rapidez do relâmpago. Podemos dividir os Espíritos em duas grandes categorias: aqueles que, depois de terem atingido o mais alto ponto da escala, deixaram definitivamente os mundos materiais, e aqueles que, pela lei da reencarnação, ainda pertencem ao turbilhão da Humanidade terrena. Admitamos que só estes últimos tenham o direito de comunicar-se com os homens, o que é uma hipótese: Entre eles há aqueles que em vida foram homens esclarecidos, cuja opinião tem autoridade, e que a gente sentir-se-ia feliz de consultar, se ainda fossem vivos. Ora, da doutrina acima resultaria que esses mesmos homens superiores tornaram-se nulidades ou mediocridades ao passar para o mundo dos Espíritos, incapazes de nos dar uma instrução de algum valor, ao passo que a gente se inclinaria respeitosamente diante deles se se apresentassem em carne e osso nas mesmas assembleias onde se recusam a escutá-los como Espíritos. Disso resulta ainda que Pascal, por exemplo, deixou de ser uma luz quando passou a ser Espírito, mas que se ele reencarnasse em Pedro ou Paulo, necessariamente com o mesmo gênio, porquanto nada teria perdido, ele seria um oráculo. Esta consequência é tão rigorosa que os partidários desse sistema admitem a reencarnação como uma das maiores verdades. Enfim, será preciso concluir que aqueles que colocam de muito boa-fé, como supomos, sua própria inteligência tão acima da dos Espíritos, serão eles próprios nulidades ou mediocridades, cuja opinião não terá valor, de sorte que seria preciso crer no que eles dizem enquanto estão vivos, e não crer amanhã, quando estiverem mortos, mesmo que viessem dizer a mesma coisa, e muito menos ainda se disserem que se enganaram. Sei que objetam a grande dificuldade da constatação da identidade. Essa questão já foi amplamente tratada, de modo que é supérfluo a ela voltar. Certamente não podemos saber, por uma prova material, se o Espírito que se apresenta sob o nome de Pascal é realmente o do grande Pascal. Que nos importa, se ele diz boas coisas? Cabe-nos pesar o valor de suas instruções, não pela forma da linguagem, que sabemos por vezes marcada pelo cunho da inferioridade do instrumento, mas pela grandeza e pela sabedoria dos pensamentos. Um grande Espírito que se comunica por um médium pouco letrado é como um hábil calígrafo que se serve de uma pena ruim. O conjunto da escrita terá o cunho de seu talento, mas os detalhes da execução, que dele não dependem, serão imperfeitos. Jamais o Espiritismo disse que era preciso fazer abnegação de seu julgamento e submeter-se cegamente ao dizer dos Espíritos; são os próprios Espíritos que nos dizem para submeter todas as suas palavras ao cadinho da lógica, ao passo que certos encarnados dizem: “Não creiais senão no que dizemos e não creiais no que dizem os Espíritos.” Ora, como a razão individual está sujeita ao erro, e o homem, muito geralmente, é levado a tomar sua própria razão e suas ideias como a única expressão da verdade, aquele que não tem a orgulhosa pretensão de se julgar infalível a submete à apreciação da maioria. Por isto é tido como abdicando de sua opinião? Absolutamente. Ele está perfeitamente livre de crer que só ele tem razão contra todos, mas isto não impedirá a opinião da maioria de prevalecer e de ter, em definitivo, mais autoridade que a opinião de um só ou de alguns. Examinemos agora a questão sob outro ponto de vista. Quem fez o Espiritismo? É uma concepção humana pessoal? Todo mundo sabe que é o contrário. O Espiritismo é o resultado do ensinamento dos Espíritos, de tal sorte que sem as comunicações dos Espíritos não haveria Espiritismo. Se a Doutrina Espírita fosse uma simples teoria filosófica nascida de um cérebro humano, ela não teria senão o valor de uma opinião pessoal; saída da universalidade do ensino dos Espíritos, tem o valor de uma obra coletiva, e é por isto mesmo que em tão pouco tempo se propagou por toda a Terra, cada um recebendo por si mesmo, ou por suas relações íntimas, instruções idênticas e a prova da realidade das manifestações. Pois bem! É em presença deste resultado patente, material, que se tenta erigir em sistema a inutilidade das comunicações dos Espíritos. Convenhamos que se elas não tivessem a popularidade que adquiriram, não as atacariam, e que é a prodigiosa vulgarização dessas ideias que suscita tantos adversários ao Espiritismo. Os que hoje rejeitam as comunicações não parecem essas crianças ingratas que negam e desprezam os seus pais? Não é ingratidão para com os Espíritos, a quem devem o que sabem? Não é servir-se do que eles ensinaram para combatê-los; voltar contra eles, contra seus próprios pais, as armas que eles nos deram? Entre os Espíritos que se manifestam não está o Espírito de um pai, de uma mãe, de seres que nos são os mais caros, dos quais se recebem essas tocantes instruções que vão diretamente ao coração? Não é a eles que devemos o ter sido arrancados da incredulidade, das torturas da dúvida sobre o futuro? E é quando se goza do benefício que se desconhece a mão benfeitora? Que dizer dos que, tomando sua opinião pela de todo mundo, afirmam seriamente que agora em parte alguma se querem comunicações? Estranha ilusão que um olhar lançado em torno deles bastaria para fazer desvanecer-se. Da parte deles, que devem pensar os Espíritos que assistem às reuniões onde se discute se se deve condescender em escutá-los, se se deve ou não excepcionalmente permitir-lhes a palavra para agradar aos que têm a fraqueza de dar importância às suas instruções? Lá se encontram sem dúvida Espíritos ante os quais cairiam de joelhos se nesse momento eles se deixassem ver. Já pensaram no preço que se poderia pagar por tal ingratidão? Tendo os Espíritos a liberdade de comunicar-se, independentemente de seu grau de saber, disso resulta uma grande diversidade no valor das comunicações, como nos escritos, num povo em que todo mundo tem a liberdade de escrever, e onde, certamente, nem todas as produções literárias são obras-primas. Segundo as qualidades individuais dos Espíritos, há, pois, comunicações boas pelo fundo e pela forma, e outras, enfim, que nada valem, nem pelo fundo nem pela forma. Cabe-nos escolher. Rejeitá-las todas porque algumas são más, não seria mais racional do que proscrever todas as publicações porque há escritores que produzem vulgaridades. Os melhores escritores, os maiores gênios, não têm coisas fracas em suas obras? Não se fazem seleções do que eles produziram de melhor? Façamos o mesmo em relação à produção dos Espíritos; aproveitemos o que há de bom e rejeitemos o que é mau; mas, para arrancar o joio, não arranquemos o bom grão. Consideremos, pois, o mundo dos Espíritos como um duplo do mundo corporal, como uma fração da Humanidade e digamos que não devemos desdenhar ouvi-los, agora que estão desencarnados, pois não o teríamos feito quando encarnados. Eles estão sempre em nosso meio, como outrora; apenas estão atrás da cortina e não à frente, eis toda a diferença. Mas, perguntarão, qual o alcance do ensino dos Espíritos, mesmo no que há de bom, se eles não ultrapassam o que os homens podem saber por si mesmos? É bem certo que eles não nos ensinam nada mais? No seu estado de Espírito, eles não veem o que não podemos ver? Sem eles, conheceríamos o seu estado, sua maneira de ser, suas sensações? Conheceríamos, como hoje conhecemos, esse mundo onde talvez estejamos amanhã? Se esse mundo não tem para nós os mesmos terrores, se encaramos sem pavor a passagem que a ele conduz, não é a eles que o devemos? Esse mundo está completamente explorado? Cada dia não nos revela uma nova face dele? E nada significa saber para onde iremos e o que poderemos ser ao sair daqui? Outrora lá entrávamos tateando e tremendo, como num abismo sem fundo; agora esse abismo é resplendente de luz e nele entramos alegres. E ousam dizer que o Espiritismo nada ensinou! (Revista Espírita, agosto de 1865: “O que ensina o Espiritismo”). Sem dúvida o ensino dos Espíritos tem limites. Não se lhe deve pedir senão o que ele pode dar, o que está na sua essência, no seu objetivo providencial; e ele dá muito a quem sabe buscar. Mas tal como ele é, já fizemos todas as suas aplicações? Antes de lhe pedir mais, sondamos as profundezas do horizonte que nos descortina? Quanto ao seu alcance, ele se afirma por um fato material, patente, gigantesco, inaudito nos fastos da história: é que ainda em sua aurora, ele já revoluciona o mundo e abala as forças da Terra. Que homem teria tido tal poder? O Espiritismo tende para a reforma da Humanidade pela caridade. Não é, pois, de admirar que os Espíritos preguem a caridade sem cessar; eles a pregarão ainda por tanto tempo quanto for necessário para desarraigar o orgulho e o egoísmo do coração do homem. Se alguns acham as comunicações inúteis, porque repetem incessantemente as lições de moral, devem ser felicitados, pois são bastante perfeitos para não mais necessitarem delas, mas eles devem pensar que os que não têm tanta confiança em seu próprio mérito e que desejam se melhorar, não se cansam de receber bons conselhos. Não busqueis, pois, tirar-lhes esse consolo. Esta doutrina tem chance de prevalecer? Como dissemos, as comunicações dos Espíritos fundamentaram o Espiritismo. Repeli-las depois de havê-las aclamado é querer solapar o Espiritismo pela base, tirar-lhe o alicerce. Tal não pode ser o pensamento dos Espíritas sérios e devotados, porque seria absolutamente como alguém que se dissesse cristão negar o valor dos ensinamentos do Cristo, sob o pretexto que sua moral é idêntica à de Platão. Foi nessas comunicações que os espíritas encontraram a alegria, a consolação, a esperança. Foi por elas que compreenderam a necessidade do bem, da resignação, da submissão à vontade de Deus; é por elas que suportam com coragem as vicissitudes da vida; por elas que não há mais separação real entre eles e os objetos de suas mais ternas afeições. Não é enganar-se com o coração humano crer que ele possa renunciar a uma crença que faz a felicidade? Repetimos aqui o que dissemos a propósito da prece: Se o Espiritismo deve ganhar em influência, é aumentando a soma das satisfações morais que proporciona. Que aqueles que o acham insuficiente tal qual é se esforcem por dar mais que ele; mas não será dando menos, tirando o que faz o seu encanto, sua força e sua popularidade que eles o suplantarão. Allan Kardec

terça-feira, 23 de outubro de 2012

PORQUE SOU ESPÍRITA

O padre do meu Quartel, bem fardado e ostentando as insígnias de capitão, iniciara um "fichário" de todo o pessoal, muito embora, de acordo com as nossas leis em vigor, nenhuma autoridade lhe coubesse para organizá-lo. Mas o "capelão" desejava saber de que se compunha o seu "rebanho" de fiéis católicos e ao qual deveria dedicar todo o zelo paternal, inclusive o de ouvir, cada uma das suas "ovelhas", em confissão - a grande arma secreta - e de ficar a par de tudo o que se passasse, inclusive com as consciências alheias. Ficou estupefato ao tomar conhecimento da existência de elevado número de adeptos da seita luterana, entre os soldados e, mais ainda, ao saber que existiam oficiais, sargentos e soldados que eram espíritas. Não me tendo sujeitado a ser "fichado" pelo ilustre capelão caí, naturalmente, no seu desagrado e foi com imenso prazer que, certa vez, alto e bom som, contei-lhe a minha história religiosa. Ei-la, em síntese: "Criado numa pequena cidade do interior do Ceará, cujo domínio religioso pertencia inteiramente aos clérigos, e subordinado ao preconceito de família, ainda criança, sem mesmo nada conhecer da maldade humana, fui levado ao confessionário, para contar... os meus pecados! Pecados de um menino de 7 anos! Plantara-se, destarte, o marco inicial de uma vida de misticismo, de pavor e de agonia, em que o receio de ir para o inferno, a cada instante, infundia tamanho medo, que concorria, cada vez mais, para tornar-me tímido e exageradamente temeroso. Felizmente, fui estudar na capital, conheci um meio mais adiantado, rompi as amarras que me prendiam às sacristias e joguei por terra os antolhos tão prejudiciais a um jovem da minha idade. Veio, depois disto, a fase da repulsa e da melhor compreensão. O paganismo da Igreja Católica embasbacara-me; as suas cerimônias litúrgicas, feitas para impressionarem o povo, desiludiram-me e fiquei descrente do catolicismo, como era de esperar. Não via o exemplo de humildade, tão preconizado pelos seus representantes, enquanto a exploração, por toda parte, constitui a o apanágio dos seus sacerdotes, que jamais deixavam de clamar por maiores "esmolas" e que recebiam "espórtulas" por tudo quanto faziam, exceto pela confissão, dado o interesse que ela representa para os "príncipes" da igreja. Era impossível continuar sendo católico, porque sempre combati o fingimento e, como homem, não devia ser hipócrita, enganando a mim mesmo. Nunca mais pisei numa igreja, a não ser ao tempo de solteiro, para olhar as pequenas, namorar ou cumprir um encontro marcado para a hora da missa domingueira, como faz muita gente por este Brasil afora. Li certa vez, que podemos abraçar o Espiritismo por duas maneiras: pelo estudo da doutrina ou forçado pelo sofrimento, que é o caso mais comum. Realmente, foi isto o que me aconteceu. O desaparecimento súbito do meu velho pai trouxe, em consequência, um profundo abatimento moral que me conduziu às raias do desespero. Seria possível continuar assim? Certamente não. Minhas responsabilidades, na vida material, eram enormes: deveres profissionais, manutenção da família e educação dos filhos, impunham-me outra atitude de energia e mais firmeza. Mas, como reagir contra tanta fraqueza? Ah! Para felicidade minha, tratei de fortalecer o espírito. Lembrei-me de recorrer à doutrina dos seres invisíveis que povoam os mundos. Recebi, pelo correio, a coleção das obras de Kardec que, a pedido meu, enviara a Federação e, daí para cá, tenho estudado constantemente tudo quanto diz respeito ao Espiritismo, conquanto continue sendo um ignorante no assunto, dadas a sua transcendência, a sua pureza e a sublimidade dos seus ensinamentos. E PORQUE SOU ESPÍRITA? Porque vi no Espiritismo a verdadeira filosofia, o caminho seguro a trilhar neste mundo cheio de escolhos, a única religião despida de exteriorizações, dado que seu caráter científico permite perscrutar a verdade e demonstrar cabalmente a excelência da vida espiritual. Porque encontrei nele a verdadeira caridade, sem publicidades e sem ostentações, a socorrer os necessitados, os sofredores e os presidiários. Porque não há hipocrisia nem falsidade; não há preces a troco de dinheiro, nem ninguém visa, exclusivamente, os bens materiais; não há ódios nem vinganças; não há diferenças sociais, nem preconceitos de cor. Porque achei nele a luz confortadora, a grandeza dos corações generosos, a sinceridade nas atitudes e o encanto nas afirmações de fé. Porque não existem ameaças aos que creem, nem perseguições aos que se não subordinam aos seus princípios salutares. Porque não se engana a ninguém, não se mistifica nem se explora o Cristo; não se emolduram personagens, nem se lhes atribuem qualidades divinas. Porque passei a compreender melhor a vida, a ser tolerante, a sentir o conforto da moral pura, que não visa livrar ninguém das fúrias demoníacas mas, apenas, o aperfeiçoamento espiritual. Porque aprendi a ser paciente, a encarar de melhor forma os problemas da vida e a procurar, sempre, fazer algo em prol da humanidade, pelo amor fraternal e para o bem-estar da própria consciência. Porque comecei a entender a felicidade terrena sob outro prisma mais realístico, mais humano e mais sentimental". *** Padre! O Espiritismo não precisa tornar-se uma religião obrigatória ou semioficial. Os que a seguem, o fazem por compreensão e por livre e espontânea vontade. Esta é a mais pura verdade! R. Alencar Nogueira Reformador (FEB) Fev 1948

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

DOGMAS E MAIS DOGMAS

Enquanto os nossos irmãos protestantes não aceitam sequer a virgindade de Maria, os católicos dia a dia procuram conduzir aquele Espírito a uma categoria mais elevada. Depois de a apresentarem como mãe de Deus e de a subdividirem em tantas nossas-senhoras quantas sejam necessárias aos interesses da Igreja, sob os mais extravagantes nomes, procuram agora convencer-nos, baseados numa lenda, de que Maria subiu aos Céus, tal qual Jesus, com o mesmo corpo apresentado entre nós. Referindo-se a esse culto prestado a Maria em que a colocam em superioridade ao próprio Deus, por, ser a genitora de uma das suas pessoas, disseram-nos os Espíritos que esse culto já ultrapassa ao que a Igreja rende ao próprio Cristo (Roustaing, IV-221); assim, diante dessa tendência do clero para deificar a Virgem como já o fizeram com Jesus, julgamos necessário transcrever o que disseram os Espíritos, quanto à posição espiritual de Maria, extraindo alguns trechos da 3ª edição da obra "Revelação da Revelação": - Maria era Espírito perfeito quando encarnou em missão. Perfeito, relativamente a nós, ao nosso planeta; não o era, porém, com relação aos mundos superiores. Espírito superior, de mui elevada hierarquia espírita, com relação a nós, não tinha ascendido ainda à perfeição sideral. (1-330). - Após uma encarnação fluídica num planeta mais adiantado que a Terra, encarnação sofrida corno consequência de pequenina falta, retomou aquele Espírito o caminho simples e reto do progresso e até hoje o trilha, pois que ainda não chegou ao cume, à perfeição sideral. (1-333). - Conquanto não se ache ainda na categoria dos Espíritos puros, suas atuais encarnações estão de tal forma acima de nossas inteligências, que não podemos fazer ideia do que sejam. Sabemos, porém, que Maria é um Espírito inferior, muito inferior a Jesus. (1-334). - O Senhor estava com Maria, mulher entre todas bendita, por ser, entre todas, Espírito muito puro no desempenho de uma missão na Terra. (1-369). - Recomendando João a Maria e esta aquele, Jesus deu o testemunho da sua solicitude pelos encarnados e homenageou os sentimentos que devem animar os filhos com relação aos pais, sentimentos que devem ligar a grande família humana. (IV-498). Como vemos, apesar do muito respeito e da muita estima que nos merece o elevado Espírito de Maria, ao qual temos recorrido muitas vezes, não podemos concordar com os dogmas da Igreja, dogmas que tendem a fazer da Virgem o que já fizeram com o Cristo, deificando-a igualmente. Nós espíritas também dirigimos preces a Maria, como o fazemos igualmente aos nossos guias e protetores; porém, entre a nossa veneração à Virgem e a outros grandes Espíritos e a divinização que lhe quer dar a Igreja, vai um infinito, um abismo quase igual ao que existe entre a criatura e o Criador, ou entre um planeta e o Universo. Se assim continuarem, dentro de mais alguns séculos já não mais terão a Trindade, visto que se tornará necessário criar um novo termo, no qual possam incluir as atuais três pessoas e mais o Espírito de Maria e talvez mesmo o de João Batista. Até lá, porém, o mundo já estará recristianizado. Os Espíritos já terão levado a verdade a todos os cantos da Terra, e os dogmas já não impressionarão a coletividade. Antônio Wantuil de Freitas Reformador (FEB) Nov 1946

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

ESPÍRITAS E FREQUENTADORES DE CENTROS

A cada dia que passa, maior número de pessoas tem procurado os recursos do Espiritismo para a solução dos seus problemas mais aflitivos. Por isso, as sessões públicas frequentemente estão repletas. Talvez um dos fatores que estão colaborando para isto seja a redução gradativa do preconceito que existia contra a Doutrina, graças à ampla divulgação através dos veículos de difusão. Entretanto, continua reduzidíssimo o número dos que efetivamente trabalham na Seara do Mestre. A grande maioria se contenta em receber. São reconhecidos pelos benefícios recebidos e esperam continuar merecendo os recursos espirituais indefinidamente. Permanecem encantados com os ensinamentos consoladores do Espiritismo, com as maravilhas da mediunidade com Jesus, com a caridade praticada na Seara ou mesmo com os próprios médiuns. Contentam-se com a adoração passiva que tem sido a sua atitude característica há séculos. Podemos, pois, dividir os assistentes das instituições espíritas em dois grupos: um, reduzido, que se desdobra na execução das múltiplas tarefas, que precisam ser executadas, e outro, numeroso, que se limita a receber, acreditando que o céu que não conseguiu conquistar frequentando os templos tradicionais, pode obtê-lo, agora, a expensas da amizade dos Espíritos Superiores. Como despertar esta grande multidão que dorme? Como faze-Ia passar da inatividade para a luta constante e efetiva na seara do Bem? Como levá-Ia a entender que a Doutrina é o roteiro que impulsiona o progresso espiritual, quando verdadeiramente vivida? Estarão sendo eficazes os métodos de estudo usados atualmente nos Centros? É possível que as respostas a estas questões só apareçam depois de muita reflexão. Mas uma coisa é certa: a única solução é orientar os frequentadores a conhecer a Doutrina Espírita com maior profundidade, a fim de que possam adotar os comportamentos que caracterizam os espíritas conscientes. Se não tomarmos medidas urgentes, correremos o risco de permitir que o Espiritismo seja concebido, pela massa de frequentadores que cresce dia a dia, como mais uma religião que garante aos seus seguidores a salvação pela simples aceitação dos seus ensinamentos e o comparecimento passivo às suas reuniões. Reformador (FEB) Abril 1981

POLÍTICA E RELIGIÃO

Hábito inveterado e condenável é esse dos oradores de comícios procurarem envolver questões de consciência religiosa nas campanhas políticas. Padres e pastores falam nos púlpitos, nos comícios, envolvendo a religião e acusando candidatos contrários de estarem a serviço de inimigos da sua igreja; outros, mais imaginosos, organizam procissões e festejos e lá se derramam pelas ruas da cidade, exibindo andores e cantores, que passam a ser elemento eleitoral, pedindo votos para adeptos do vigário, do pastor, bispo ou apóstolo (quando não para os próprios) e ainda pragas para os "inimigos" da sua (deles) religião. Imitando agrupamentos políticos que defendem interesses comuns como, por exemplo, a bancada ruralista, surgiu também a ‘bancada evangélica’ com se o Cristo de Deus necessitasse de representantes seus no Congresso Nacional. Nosso Governador governa e não se submete às miudezas daqueles que buscam a matéria através de neg ociações nem sempre muito claras e oriundas dos calabouços da política. A errada e perigosa mania de usar-se dessa ferramenta de paz e amor para fins eleitorais, suporta o que há de condenável e desenfreado no processo partidarista. O bispo disse, o arcebispo não disse, quem disse foi o pastor, a Cúria negou... É assim que se costuma fazer política partidária, vingativa, odienta, sectarista e intolerante, deseducando o povo, habituando a mocidade e as crianças que leem ou vão ouvir oradores nos comícios, a desrespeitar o direito de voto, a desprestigiar o regime democrático, a estimular mentiras, a nutrir desavenças, a robustecer ódios. Entendemos que, trocando o púlpito por uma tribuna de achincalhes partidários, estarão os sacerdotes e pastores se nivelando a qualquer pecador, não lhes sendo mais razoável falar como Pastores de Almas mas sim como caçadores de votos mundanos . AS IGREJAS – A DE ROMA OU AS REFORMADAS - vão mal com sacerdotes que mais se entregam à paixão política do que à beleza espiritual de seu magistério divino. Espíritas, amai-vos, eis o primeiro mandamento. Instruí-vos, eis o segundo. No mais, oremos para que nossas escolhas políticas acertem em seus mandatos de forma a refletirem os ensinamentos do Mestre Jesus em seus atos e palavras. Decalcado de um artigo de Reformador (FEB) de Jan 1948

SOBRE ANIMAIS

Com o advento das idéias espiritistas no mundo, torna-se um estudo obrigatório e para todos os dias o grande problema que implica o drama da evolução anímica. Será a alma criada no momento da concepção na mulher, segundo as teoria anti-reencarnacionistas? O Espírito já é criado, pela Potência Suprema do Universo, apto a ingressar nas fileiras humanas? E os pensadores se voltam para os vultos eminentes do passado. As autoridades católicas valem-se de Tomás de Aquino que acreditava na criação da alma no período de tempo que precede ao nascimento de um novo ser, esquecendo-se dos grandes padres da antigüidade, como Orígenes, cuja obra é um atestado eterno, em favor da verdade da preexistência. Outras doutrinas religiosas buscam a opinião falível da sua ortodoxia e dos seus teólogos, relutando em aceitar as realidades luminosas da reencarnação. Pascal, escrevendo em tenra idade o seu tratado sobre os cones e inúmeros Espíritos de escol, laborando com a sua genialidade precoce nas grandes tarefas para que foram chamados à Terra, constituem uma prova eloqüente, aos olhos dos menos perspicazes e ao estudo de mentalidades tardas no raciocínio, a prol da verdade reencarnacionista. O homem atual recorda instintivamente os seus labores e as suas experiências do passado. A sua existência de hoje é a continuação de quanto efetuou nos dias do pretérito. As conquistas de agora representam a soma dos seus esforços de antanho. E a civilização é a grande oficina onde cada um deixa estereotipada a sua própria obra. Contempla-se, porém, até hoje, a sombra dos princípios, como noite insondável sobre abismos. Os desencarnados da minha esfera não se acham, por enquanto, indenes do socorro das hipóteses. A única certeza obtida é a da imortalidade da vida e, como não nos é possível absorver a essência da sabedoria sem iniciativas individuais e sem ardorosos trabalhos, discutimos e estudamos as nobres questões que, em Terra, escaldaram o nosso pensamento. Um desses problemas, que mais assombram pela sua singular transcendência, é o das origens. Se, na terra, o progresso humano vem através de dois caminhos: o da ciência e o da revelação espiritual, ainda não encontramos, em nossa evolução relativa nenhuma estrada estritamente científica para determinar o Alfa do Universo senão dentro das hipóteses plausíveis. Contudo, saturados da mais profunda compreensão moral, copiosa é a nossa fonte de revelações, a qual representa para nós um elemento granítico, servindo de base à sabedoria de amanhã. Se bem que haja, no próprio círculo dos estudiosos do espaço, o grupo dos opositores das grandes idéias de evolucionismo do princípio espiritual, através das espécies, sou dos que o estudam carinhosa e atentamente. Eminentes naturalistas do mundo, como Charles Darwin, vislumbraram grandiosas verdades, levando a efeito preciosos estudos que, aliás, se prejudicaram pelo excessivo apego à ciência terrena, que se modifica e transforma como os próprios homens. Mas, posso afirmar, sem laivos de dogmatismo que, oriundos da flora microbiana, em séculos remotíssimos, não poderemos precisar onde se encontra o cume das espécies ou da escala dos seres, no pentagrama universal. E, como o objetivo desta palestra é o estudo dos animais, nossos irmãos inferiores, sinto-me à vontade para declarar que todos nós já nos debatemos no seu acanhado círculo evolutivo. Eles são nossos parentes próximos, apesar da teimosia de quantos persistem em não os reconhecer como tais. Considera-se, às vezes, uma afronta ao gênero humano a aceitação dessa verdade. E pergunta-se: poderíamos admitir um princípio espiritual nas arremetidas furiosos das feras indomesticadas? Poderia haver um raio da luz de Deus na serpente venenosa, ou na astúcia traiçoeira dos carnívoros? Semelhantes inquirições contudo, são filhas de um entendimento pouco atilado. Atualmente, precisamos modificar todos os conceitos acerca de Deus, porquanto nos falece autoridade para defini-Lo e individualiza-lo. Deus existe. Eis a nossa luminosa afirmação, sem podermos, todavia, classificá-lo em sua essência. Os que nos interpelam dessa forma olvidam as histórias das calúnias, dos homicídios, das perversidades humanas. Para que o homem se conservasse nessa posição especial de perfectibilidade única, deveria representar a entidade irrepreensível dentro do orbe, onde foi chamado a viver. Tal não se verifica e, diariamente comentais os dramas dolorosos da humanidade, os assassínios, os nefandos infanticídios, efetuados em circunstâncias nas quais, muitas vezes, as faculdades irracionais operariam com maior benignidade, clemência e conhecimento das leis que regem o mundo. Os animais têm a sua linguagem, os seus afetos, a sua inteligência rudimentar com atributos inumeráveis. São os irmãos mais próximos do homem, merecendo por isso a sua proteção e o seu amparo. Seria difícil ao médico legista determinar, nas manchas de sangue, qual o que pertenceu ao homem ou ao animal, tal identidade dos elementos que o compõem. A organização óssea de ambos é quase a mesma, variando apenas na sua conformação observando-se diminuta diferença nas vértebras. O homem está para os irracionais simplesmente como um superior hierárquico. Nos animais, desenvolvem-se igualmente as faculdades intelectuais. Os sentimentos de curiosidade é, na maioria deles, altamente avançado e muitas espécies nos demonstram as suas elevadas qualidades, exemplificando o amor conjugal, o sentimento de paternidade, o amparo ao próximo, as faculdades de imitação, o gosto da beleza. Basta que se possua um sentimento acurado de observação e de análise. Eminentes Espíritos trouxeram à luz o fruto de suas interessantes pesquisas, que para vós todos são de inigualável valor. Entre muitos, citaremos Darwin, Gartiolet e inúmeros outros estudiosos, dedicados a esses notáveis problemas. Os animais, mesmo os mais ferozes, têm para com a sua prole ilimitada ternura. Aves existem que se deixam matar, quando não se lhes permite a defesa das suas famílias. Os cães, os cavalos, os macacos, os elefantes deixam entrever apreciáveis qualidades de inteligência. É conhecido o caso dos cavalos de um regimento que mastigaram o feno para um dos seus companheiros inutilizado e enfermo. Conta-se que uma fêmea de cinocéfalo, muito conhecida por sua mansidão, gostava de recolher macaquinhos, gatos e cães, dos quais cuidava com admirável carinho. Certo dia, um gato revoltou-se contra a sua benfeitora, arranhando-lhe o rosto; mãe adotiva, revelando a mais refletida inteligência, examinou-lhe as patas e lhe cortou com os dentes as unhas pontiagudas. Constitui um fato observável a sensibilidade dos cães e dos cavalos ao elogio e às reprimendas. Longe iríamos com as citações. O que podemos assegurar é que sobre os mundos, laboratórios da vida no universo, todas as forças naturais contribuem para o nascimento do ser. De milênios remotos viemos todos nós, em pesados avatares. Da noite, ainda para nós insondável, dos grandes princípios, emergimos para o concerto da Vida. A origem constitui para nós um mistério cuja solução nos é, por enquanto, inacessível, mas sabemos que todos os seres inferiores e superiores participam do patrimônio da Luz universal. Em que esfera estivemos um dia esperando o desabrochamento de nossa racionalidade? Desconheceis ainda os processos, os modismos dessas transições, dessas passagens pelas espécies, evoluindo sempre, buscando a perfeição suprema e absoluta; mas, um laço de amor nos reúne a todos diante da Entidade Suprema do Universo. É certo que o Espírito jamais retrograda, constituindo uma infantilidade as teorias da metempsicose dos egípcios, na antiguidade. Porém, se é impossível o regresso da alma humana ao círculo da irracionalidade, recebei como obrigação sagrada, como alto dever amparar os animais, não obstante a sua posição inferior no planeta. Estendei até eles a vossa concepção de solidariedade e o vosso coração compreenderá, mais profundamente, os grandes segredos da evolução, entendendo os maravilhosos e doces mistérios da Vida. Emmanuel por Chico Xavier mensagem recebida em 02.10.1936. Reformador (FEB) 16.01.1937 Curtir •

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

ORGANIZAÇÃO DO ESPIRITISMO (Revista Espírita, dezembro de 1861)

ORGANIZAÇÃO DO ESPIRITISMO (Revista Espírita, dezembro de 1861) 1. Até o presente, embora muito numerosos, os espíritas se têm disseminado por todos os países, o que não é um dos caracteres menos salientes da Doutrina. Como uma semente levada pelo vento, ela fixou raízes em todos os pontos do globo, prova evidente de que sua propagação não é efeito de uma camarilha, nem de uma influência local e pessoal. A princípio isolados, os adeptos se surpreenderam hoje com seu número, e como a similitude de ideias inspira o desejo de aproximação, procuram reunir-se e fundar sociedades. Assim, de toda parte nos pedem instruções a propósito, manifestando o desejo de união à Sociedade central de Paris. É, pois, chegado o momento de nos ocuparmos do que se pode chamar a organização do Espiritismo. Sobre a formação das sociedades espíritas, o Livro dos Médiuns (2.ª edição) contém observações importantes, às quais remetemos os interessados, pedindo-lhes que meditem com cuidado. Diariamente a experiência vem confirmar-lhes a justeza, que lembraremos de modo sucinto, acrescentando instruções mais circunstanciadas. 2. Inicialmente falemos dos adeptos ainda isolados em meio a uma população hostil ou ignorante das ideias novas. Diariamente recebemos cartas de pessoas que estão neste caso e que perguntam o que podem fazer na ausência de médiuns e de coparticipantes do Espiritismo. Eles estão na situação em que, apenas há um ano, se achavam os primeiros espíritas dos mais numerosos centros de hoje. Pouco a pouco multiplicaram-se os adeptos e há cidades onde praticamente se contaram por unidades isoladas, mas hoje o são por centenas e milhares. Em breve dar-se-á o mesmo em toda parte. É uma questão de paciência. Quanto ao que devem fazer, é muito simples. A princípio podem trabalhar por conta própria e penetrar-se da doutrina pela leitura e meditação das obras especiais. Quanto mais se aprofundarem, mais verdades consoladoras descobrirão, confirmadas pela razão. Em seu isolamento, devem julgar-se felizes por terem sido os primeiros favorecidos. Mas se se limitassem a colher na Doutrina uma satisfação pessoal, seria uma espécie de egoísmo. Em razão de sua própria posição, têm uma bela e importante missão a cumprir: a de espalhar a luz em seu redor. Os que aceitarem essa missão e não se deixarem deter pelas dificuldades, serão largamente recompensados pelo sucesso e pela satisfação de haver feito uma coisa útil. Sem dúvida encontrarão oposição. Serão motivo da troça e dos sarcasmos dos incrédulos, e mesmo da malevolência das pessoas interessadas em combater a doutrina, mas onde estaria o mérito se não houvesse obstáculos a vencer? Assim, aos que fossem detidos pelo medo pueril do que diriam, nada temos a dizer, nenhum conselho a dar. Mas aos que têm a coragem de sua opinião, e que estão acima das mesquinhas considerações mundanas, diremos que o que têm a fazer se limita a falar abertamente do Espiritismo, sem afetação, como de uma coisa muito simples e muito natural, sem pregá-la, e sobretudo sem buscar nem forçar convicções, nem fazer prosélitos a todo custo. O Espiritismo não deve ser imposto. Vem-se a ele porque dele se necessita, e porque ele dá o que não dão as outras filosofias. Convém mesmo não entrar em explicações com os incrédulos obstinados, pois seria dar-lhes muita importância e levá-los a pensar que se depende deles. Os esforços que se façam para atraí-los afastam-nos, e, por amor-próprio, eles resistem na sua oposição. Eis por que é inútil perder tempo com eles. Quando a necessidade se fizer sentir, virão por si mesmos. Enquanto se espera, é preciso deixá-los tranquilos, satisfeitos no seu ceticismo que, acreditai, muitas vezes lhes pesa mais do que eles gostariam de deixar transparecer, porque, por mais que digam em contrário, a ideia do nada após a morte tem algo de mais apavorante, de mais pungente que a própria morte. Ao lado dos trocistas se encontrarão pessoas que irão perguntar: “Que é isto?” Esforçai-vos, então, para satisfazê-las, proporcionando-lhes explicações conforme as disposições que neles encontrardes. Quando se fala do Espiritismo em geral, é preciso considerar as palavras que se pronunciam como grãos lançados a esmo. Muitos caem nas pedras e nada produzem, mas se um único tiver caído em terra fértil, considerai-vos felizes. Cultivai-o e ficai certos de que essa planta, frutificando, terá renovos. Para alguns adeptos a dificuldade é responder a certas objeções. A leitura atenta das obras lhes fornecerá os meios, mas sobretudo poderão servir-se, com esse objetivo, da brochura que vamos publicar sob o título de: Refutação das críticas contra o Espiritismo, do ponto de vista materialista, científico e religioso. 3. Falemos agora da organização do Espiritismo nos centros já numerosos. O aumento incessante dos adeptos demonstra a impossibilidade material de constituir numa cidade, sobretudo numa cidade populosa, uma sociedade única. Além do número, há a dificuldade das distâncias, que é obstáculo para muitos. Por outro lado, é sabido que as grandes reuniões são menos favoráveis às belas comunicações, e que as melhores são obtidas nos pequenos grupos. É necessário, pois, empenhar-se em multiplicar os grupos particulares. Ora, como dissemos, vinte grupos de quinze a vinte pessoas obterão mais e farão mais pela propaganda do que uma sociedade única de quatrocentos membros. Os grupos se formam naturalmente, pela afinidade de gostos, de sentimentos, de hábitos e de posição social. Todos ali se conhecem e, como são reuniões particulares, tem-se liberdade de definir a quantidade e de selecionar os que são admitidos. 4. O sistema da multiplicação dos grupos tem ainda como resultado, conforme o dissemos em várias ocasiões, de impedir os conflitos e as rivalidades por supremacia e presidência. Cada grupo naturalmente é dirigido pelo chefe da casa, ou por aquele que para isso for designado. Não há, a bem dizer, presidente oficial, pois tudo se passa em família. O dono da casa, como tal, tem toda a autoridade para manter a boa ordem. Com uma sociedade propriamente dita, há necessidade de um local especial, de um pessoal administrativo, de um orçamento, numa palavra, uma complicação de engrenagens que a má vontade de alguns dissidentes mal intencionados poderia comprometer. 5. A essas considerações, longamente desenvolvidas no Livro dos Médiuns, adicionaremos uma que é preponderante. O Espiritismo ainda não é visto com bons olhos por todo o mundo. Dentro em pouco compreender-se-á que é de todo o interesse favorecer uma crença que torna os homens melhores é uma garantia da ordem social. Mas, até que estejam convencidos de sua benéfica influência sobre o espírito das massas e de seus efeitos moralizadores, os adeptos devem esperar que, seja por ignorância do verdadeiro objetivo da doutrina, seja em vista do interesse pessoal, lhe suscitarão embaraços. Não serão apenas ridicularizados, mas, quando se quebrarem as armas do ridículo, serão caluniados. Serão acusados de loucura, de charlatanismo, de irreligião, de feitiçaria, a fim de contra eles incitar o fanatismo. De loucura! Sublime loucura esta que faz crer em Deus e no futuro da alma! Para os que em nada creem, é de fato uma loucura acreditar na comunicação entre mortos e vivos, loucura que faz a volta ao mundo e atinge os homens mais eminentes. De charlatanismo! Eles têm uma resposta peremptória: o desinteresse, pois o charlatanismo jamais é desinteressado. De irreligião! Eles que, desde que se tornaram espíritas, são mais religiosos do que antes. De feitiçaria e comércio com o diabo! Eles, que negam a existência do diabo e só reconhecem a Deus como senhor onipotente, soberanamente justo e bom. Singulares feiticeiros estes que renegariam o seu senhor e agiriam em nome de seu antagonista! Na verdade, o diabo não deveria estar contente com seus adeptos. Mas as boas razões são a menor preocupação dos que querem travar discussões. Quando alguém quer matar seu cão, diz que ele está raivoso. Felizmente a Idade Média lança os últimos e pálidos clarões sobre o nosso século. Como o Espiritismo lhe vem dar o golpe de misericórdia, não é de admirar vê-la tentar um supremo esforço. Mas, tenhamos certeza, a luta não será longa. Contudo, que a certeza da vitória não nos torne imprudentes, porque uma imprudência poderia, senão comprometer, pelo menos retardar o sucesso. Por esses motivos, a constituição de sociedades numerosas talvez encontrasse obstáculos em certas localidades, ao passo que o mesmo não ocorreria com as reuniões familiares. 6. Acrescentemos mais uma consideração. As sociedades propriamente ditas estão sujeitas a numerosas vicissitudes; mil causas, dependentes ou não de sua vontade, podem conduzi-la à dissolução. Suponhamos que uma sociedade espírita tenha reunido todos os adeptos de uma mesma cidade e que, por uma circunstância qualquer, deixe de existir. Eis os membros dispersos e desorientados. Agora, se em vez disto houver cinquenta grupos, se alguns desaparecerem sempre restarão outros, e outros se formarão. São outras tantas plantas vivazes que brotam, apesar de tudo. Não tenhais num campo somente uma grande árvore, pois um raio pode abatê-la. Tende cem, e o mesmo raio não atingiria todas, e quanto menores, menos expostas estarão. Assim, tudo milita em favor do sistema que propomos; quando um primeiro grupo, fundado em qualquer parte, se tornar muito numeroso, que faça como as abelhas: que enxames saídos da colmeia-mãe fundem novas colmeias que por sua vez formarão outras. Serão outros tantos centros de ação irradiando em seu respectivo círculo, mais poderosos para a propaganda do que uma Sociedade única. 7. A formação dos grupos estando, pois, admitida em princípio, muitas questões importantes restam para examinar. A primeira de todas é a uniformidade na doutrina. Essa uniformidade não seria melhor garantida por uma Sociedade compacta, pois os dissidentes sempre teriam facilidade de se retirar, formando grupo à parte. Quer a sociedade seja una ou fracionada, a uniformidade será a consequência natural da unidade de base que os grupos adotarem. Ela será completa em todos os grupos que seguirem a linha traçada pelo Livro dos Espíritos e o Livro dos Médiuns. Um contém os princípios da filosofia da ciência; o outro, as regras da parte experimental e prática. Essas obras estão escritas com bastante clareza para não dar lugar a interpretações divergentes, condição essencial de toda nova doutrina. Até o presente essas obras servem de regulador à imensa maioria dos espíritas, e por toda parte são acolhidas com inequívoca simpatia. Os que delas quiseram afastar-se puderam reconhecer, por seu isolamento e pelo decrescente número de seus partidários, que não tinham a seu favor a opinião geral. Tal assentimento, dado pelo maior número, tem grande valor. É um julgamento que não poderia ser suspeito de influência pessoal, desde que espontâneo e declarado por milhares de pessoas que nos são completamente desconhecidas. Uma prova desse assentimento é que nos pediram para traduzi-las para diversas línguas: espanhol, inglês, português, alemão, italiano, polonês, russo e até tártaro. Sem presunção podemos, pois, recomendar o seu estudo e a sua prática nas diversas reuniões espíritas, e isto com tanto mais razão quanto são as únicas, até o momento, em que a ciência é tratada de maneira completa. Todas as que foram publicadas sobre a matéria apenas abordaram alguns pontos isolados da questão. Aliás, não temos absolutamente a pretensão de impor as nossas ideias. Emitimo-las por ser direito nosso. Que as adotem aqueles a quem elas convêm. Os demais têm o direito de rejeitá-las. As instruções que damos são, pois, e naturalmente, para os que marcham conosco; para os que nos honram com o título de seu chefe espírita e de modo algum pretendemos regulamentar os que querem seguir outra via. Entregamos a doutrina que professamos à apreciação geral. Ora, temos encontrado muitos aderentes para nos dar confiança e nos consolar de algumas dissidências isoladas. Aliás, o futuro será o juiz em última instância. Com os homens atuais desaparecerão, pela força das coisas, as susceptibilidades do amor-próprio ferido, as causas de ciúme, de ambição e de frustração de esperanças materiais. Não mais considerando as pessoas, ver-se-á apenas a doutrina, e o julgamento será imparcial. Quais as ideias novas que, no seu aparecimento, não tiveram seus contraditores mais ou menos interessados? Quais os propagadores dessas ideias que não foram alvo dos ataques da inveja, sobretudo se o sucesso lhes coroou os esforços? Mas voltemos ao nosso assunto. 8. O segundo ponto é a constituição dos grupos. Uma das primeiras condições é a homogeneidade, sem a qual não haveria comunhão de pensamento. Uma reunião não pode ser estável, nem séria, se não houver simpatia entre os componentes. E não pode haver simpatia entre pessoas que têm ideias divergentes e que fazem uma oposição surda, quando não aberta. Longe de nós com isso dizer que seja necessário abafar a discussão, porque, ao contrário, recomendamos o exame escrupuloso de todas as comunicações e de todos os fenômenos. Fica, pois, bem entendido que cada um pode e deve emitir sua opinião, mas há pessoas que discutem para impor a sua e não para esclarecer. É contra o espírito de oposição sistemática que nos levantamos; contra as ideias preconcebidas que não cedem nem mesmo ante a evidência. Tais pessoas incontestavelmente são uma causa de perturbação que é preciso evitar. A este respeito, as reuniões espíritas estão em condições excepcionais. O que elas requerem, acima de tudo, é o recolhimento. Ora, como estar recolhido se a cada momento a gente é distraída por uma polêmica acrimoniosa? Se reina entre os assistentes um sentimento de azedume e quando se sente em torno de si, seres que sabemos hostis e em cujo rosto se lê o sarcasmo e o desdém por tudo quanto não está de acordo com a sua opinião? 9. No Livro dos Médiuns (nº 28) traçamos o caráter das principais variedades de espíritas; sendo tal distinção importante para o assunto que nos ocupa, julgamos dever lembrá-la. Pode-se pôr em primeira linha os que acreditam pura e simplesmente nas manifestações. Para eles o Espiritismo é apenas uma ciência de observação, uma série de fatos mais ou menos curiosos; a filosofia e a moral são acessórios de que pouco se ocupam e cujo alcance não os preocupa. Chamamo-los espíritas experimentadores. Vêm a seguir os que veem no Espiritismo algo além dos fatos. Compreendem o seu alcance filosófico; admiram a moral dele decorrente, mas não a praticam; extasiam-se ante as belas comunicações, como ante um sermão eloquente que ouvem, mas do qual não tiram proveito. A influência sobre o seu caráter é insignificante ou nula. Em nada mudam seus hábitos e não se privam de nenhum prazer: o avarento é sempre sovina, o orgulhoso sempre cheio de si, o invejoso e o ciumento sempre hostis. Para eles a caridade cristã é apenas uma bela máxima e os bens deste mundo prevalecem, em sua estima, sobre os do futuro. São os espíritas imperfeitos. Ao lado destes há outros, mais numerosos do que se pensa, que não se limitam a admirar a moral espírita, mas que a praticam e a aceitam em todas as suas consequências. Convencidos de que a existência terrena é uma prova passageira, tratam de aproveitar estes curtos instantes para avançar na via do progresso, esforçando-se por fazer o bem e reprimir suas más inclinações. Suas relações são sempre seguras, porque a convicção os afasta de todo mau pensamento. Em tudo a caridade é sua regra de conduta. São os verdadeiros espíritas, ou melhor, os espíritas cristãos. 10. Se bem compreendido o que precede, compreender-se-á também que um grupo formado exclusivamente por elementos desta última classe estaria nas melhores condições, porque somente entre praticantes da lei de amor e de caridade é que se pode estabelecer uma séria ligação fraternal. Entre homens para quem a moral é mera teoria, a união não seria durável. Como eles não impõem nenhum freio ao orgulho, à ambição, à vaidade e ao egoísmo, não o imporão, também, às suas palavras; quererão ser os primeiros, quando deveriam diminuir-se; irritar-se-ão com as contradições e não terão escrúpulos em semear a perturbação e a discórdia. Entre verdadeiros espíritas, ao contrário, reina um sentimento de confiança e de benevolência recíproca. Nesse meio simpático é possível sentir-se à vontade, ao passo que há constrangimento e ansiedade num ambiente misto. 11. Isto está na natureza das coisas e nada inventamos a respeito. Daí se segue que na formação de grupos deva exigir-se a perfeição? Seria simplesmente absurdo, pois seria querer o impossível, e nessas condições ninguém poderia pretender dele fazer parte. Tendo por objetivo a melhora dos homens, o Espiritismo não vem procurar os perfeitos, mas os que se esforçam em tornar-se perfeitos pondo em prática os ensinos dos Espíritos. O verdadeiro espírita não é o que alcançou a meta, mas o que seriamente quer atingi-la. Sejam quais forem os seus antecedentes, será bom espírita desde que reconheça suas imperfeições e seja sincero e perseverante no propósito de emendar-se. Para ele o Espiritismo é uma verdadeira regeneração, porque ele rompe com o seu passado. Indulgente para com os outros, como quereria que fossem para consigo, de sua boca não sairá nenhuma palavra malévola nem cortante contra ninguém. Aquele que, numa reunião, se afastasse das conveniências, não só provaria uma falta de cortesia e de urbanidade, mas uma falta de caridade. Aquele que se chocasse com a contradição e pretendesse impor a sua personalidade ou as suas ideias, daria prova de orgulho. Ora, nem um nem outro estariam no caminho do verdadeiro Espiritismo, isto é, do Espiritismo cristão. Aquele que pensa ter uma opinião mais justa que os outros, poderá fazê-la mais bem aceita pela doçura e pela persuasão. O azedume, de sua parte, seria uma péssima opção. 12. A simples lógica demonstra, pois, a quem quer que conheça as leis do Espiritismo, quais os melhores elementos para a composição dos grupos realmente sérios, e não hesitamos em dizer que são estes que têm a maior influência na propagação da doutrina. Pela consideração com que são dirigidos, e pelo exemplo que dão de suas consequências morais, provam a sua gravidade e impõem silêncio à troça que, quando se contrapõe ao bem, é mais do que ridícula, porque é odiosa. Mas que quereis que pense um crítico incrédulo que assiste a experiências cujos assistentes são os primeiros a considerá-la um brinquedo? Dela sai ainda mais incrédulo do que entrou. 13. Acabamos de indicar a melhor composição dos grupos; mas a perfeição não é mais possível nos conjuntos do que nos indivíduos; nós indicamos o objetivo e dizemos que quanto mais nos aproximarmos dele, mais satisfatórios serão os resultados. Por vezes pode-se ser dominado pelas circunstâncias, mas é para subtrai-se aos obstáculos que se devem direcionar todos os cuidados. Infelizmente, quando um grupo é criado, não se é suficientemente rigoroso na escolha, porque, antes de tudo, se quer formar um núcleo; para nele ser admitido, quase sempre basta um simples desejo ou uma adesão qualquer às ideias mais gerais do Espiritismo. Mais tarde, percebe-se que se foi demasiado fácil. 14. Num grupo sempre há o elemento estável e o flutuante. O primeiro é composto de pessoas assíduas, que formam a base; o segundo, das que são admitidas temporária e acidentalmente. É à composição do elemento estável que é essencial prestar escrupulosa atenção, e neste caso não se deve hesitar em sacrificar a quantidade à qualidade, porque é ele que impulsiona e serve de regulador. O elemento flutuante é menos importante, porque se tem liberdade de modificá-lo à vontade. Não se deve perder de vista que as reuniões espíritas, como aliás todas as reuniões em geral, têm as fontes de sua vitalidade na base sobre as quais se assentam. Neste particular, tudo depende do ponto de partida. Aquele que tem a intenção de organizar um grupo em boas condições deve, antes de tudo, assegurar-se do concurso de alguns adeptos sinceros, que levem a doutrina a sério e cujo caráter conciliatório e benevolente seja conhecido. Formado esse núcleo, ainda que de três ou quatro pessoas, se estabelecerá regras precisas, quer para as admissões, quer para a realização de sessões e para a ordem dos trabalhos, regras às quais os recém-vindos terão que se conformar. Essas regras podem sofrer modificações conforme as circunstâncias, mas há algumas que são essenciais. 15. Sendo a unidade de princípios um dos pontos essenciais, ela não pode existir naqueles que, não tendo estudado, não podem ter opinião formada. A primeira condição a impor se não se quiser distrair a cada instante por objeções ou por questões inúteis é, portanto, o estudo prévio. A segunda é uma profissão de fé categórica e uma adesão formal à doutrina do Livro dos Espíritos, além de outras condições especiais julgadas convenientes. Isto quanto aos membros titulares e dirigentes; para os ouvintes, que geralmente vêm para adquirir um pouco mais de conhecimentos e de convicção, pode-se ser menos rigoroso; contudo, como existem os que poderiam causar perturbação com observações fora de propósito, é importante assegurar-se de suas disposições. É necessário sobretudo, e sem exceção, afastar os curiosos e quem quer que seja atraído por motivo frívolo. 16. A ordem e a regularidade dos trabalhos são igualmente essenciais. Consideramos eminentemente útil abrir cada sessão pela leitura de algumas passagens do Livro dos Médiuns e do Livro dos Espíritos. Por esse meio ter-se-ão sempre presentes à memória os princípios da ciência e os meios de evitar os escolhos encontrados a cada passo na prática. Assim, a atenção se fixará sobre muitos pontos que por vezes escapam numa leitura particular e poderão dar lugar a comentários e discussões instrutivas, das quais os próprios Espíritos poderão participar. Não é menos necessário recolher em pastas todas as comunicações recebidas, por ordem de data, com indicação do médium que serviu de intermediário. Esta última referência é útil para o estudo do gênero da faculdade de cada um. Muitas vezes, porém, acontece que tais comunicações são esquecidas, tornando-se letra morta. Isto desencoraja os Espíritos que as haviam dado visando a instrução dos assistentes. É essencial, pois, fazer uma coletânea das mais instrutivas e lê-las de tempos em tempos. Muitas vezes essas comunicações são de interesse geral e não são dadas pelos Espíritos apenas para a instrução de uns poucos e para serem abandonadas nos arquivos. Assim, é útil que sejam levadas ao conhecimento de todos, pela publicidade. Examinaremos esta questão em artigo no próximo número, indicando o modo mais simples, o mais econômico e ao mesmo tempo o mais próprio para alcançar o objetivo. 17. Como se vê, nossas instruções se dirigem exclusivamente aos grupos formados por elementos sérios e homogêneos; aos que querem seguir a rota do Espiritismo moral, visando o progresso de cada um, objetivo essencial e único da doutrina; enfim, aos que nos querem mesmo aceitar por guia e levar em conta os conselhos de nossa experiência. É incontestável que um grupo formado nas condições indicadas funcionará com regularidade, sem entraves e de maneira proveitosa. O que um grupo pode fazer, outros também o podem. Suponhamos, então, numa cidade, um número qualquer de grupos constituídos nas mesmas bases; haverá necessariamente entre eles unidade de princípios, pois seguem a mesma bandeira; união simpática, pois têm por máxima amor e caridade; são, numa palavra, os membros de uma mesma família, entre os quais não poderia ter concorrência, nem rivalidade de amor-próprio, se estão todos animados dos mesmos sentimentos para o bem. 18. Entretanto, seria útil que houvesse entre eles um ponto de ligação, um centro de ação. Conforme as circunstâncias e as localidades, os diversos grupos, pondo de lado questões pessoais, poderiam designar para isto aquele que, por sua posição e sua importância relativa, fosse o mais apto para dar ao Espiritismo um impulso salutar. Conforme a necessidade, e se fosse preciso evitar susceptibilidades, um grupo central, formado de delegados de todos os grupos, tomaria o nome de grupo diretor. Na impossibilidade de nos correspondermos com todos, com este teríamos relações mais diretas. Também poderíamos, em certos casos, designar uma pessoa encarregada mais especialmente para nos representar. Sem prejuízo das relações que se estabelecerão pela força das coisas, entre os grupos de uma mesma cidade que trilham caminhos idênticos, uma assembleia geral anual poderia reunir os espíritas dos diversos grupos numa festa familiar, que seria, ao mesmo tempo, a festa do Espiritismo. Seriam pronunciados discursos e lidas as comunicações mais notáveis, ou as mais apropriadas às circunstâncias. O que é possível entre os grupos de uma mesma cidade, também o é entre os grupos diretores de diversas cidades, desde que entre eles haja comunhão de vistas e de sentimentos, isto é, desde que possam manter relações recíprocas. Indicaremos os meios para isto, quando falarmos do modo de publicidade. 19. Como se vê, tudo isto é de execução muito simples e sem engrenagens complicadas, mas tudo depende do ponto de partida, isto é, da composição dos grupos primitivos. Se eles forem constituídos por bons elementos, serão outras tantas boas raízes que darão bons renovos. Se, ao contrário, forem formados por elementos heterogêneos e antipáticos; por espíritas duvidosos, mais ocupados com a forma do que com o fundo, que consideram a moral como parte acessória e secundária, há que esperar polêmicas irritantes e sem saída; pretensões pessoais; choques de susceptibilidades e, em consequência, conflitos precursores da desorganização. Entre verdadeiros espíritas, tais quais os definimos, que veem o objetivo essencial do Espiritismo na moral, que é a mesma para todos, haverá sempre abnegação da personalidade, condescendência e benevolência e, por conseguinte, segurança e estabilidade nas relações. Eis por que temos insistido tanto sobre as qualidades fundamentais. 20. Talvez digam que estas severas restrições constituem um obstáculo à propagação; é um erro. Não acrediteis que abrindo a porta ao primeiro que aparecer fareis mais prosélitos. A experiência aí está para mostrar o contrário. Seríeis assaltados por uma multidão de curiosos e indiferentes, que ali viriam como para um espetáculo. Ora, os curiosos e os indiferentes são embaraços e não auxiliares. Quanto aos incrédulos por sistema ou por orgulho, por mais que lhes mostreis, não tratarão disso senão com zombaria, porque não o compreenderão e não querem dar-se ao trabalho de compreender. Já o dissemos, e não seria demais repetir, que a verdadeira propagação, a que é útil e frutífera, é feita pelo ascendente moral das reuniões sérias. Se houvessem acontecido apenas reuniões desse tipo, os espíritas seriam ainda mais numerosos, porque, é bom que se diga, muitos foram desviados da doutrina porque só assistiram a reuniões fúteis, sem ordem e sem seriedade. Sede, pois, sérios, na plena acepção da palavra, e as pessoas sérias virão a vós. São esses os melhores propagadores, porque falam com convicção e tanto pregam pelo exemplo quanto pela palavra. 21. Do caráter essencialmente sério das reuniões não se deve inferir que se tenha de proscrever sistematicamente as manifestações físicas. Como dissemos no Livro dos Médiuns (nº. 326), elas são de incontestável utilidade, do ponto de vista do estudo dos fenômenos e para a convicção de certas pessoas. No entanto, para obter-se proveito sob esse duplo ponto de vista, há que excluir-se todo pensamento frívolo. Uma reunião que possuísse um bom médium de efeitos físicos e que se ocupasse desse gênero de manifestações com ordem, método e seriedade, cuja condição moral oferecesse toda a garantia contra o charlatanismo e a fraude, não só poderia obter coisas notáveis, do ponto de vista fenomênico, mas produziria o bem em abundância. Assim, aconselhamos a não desprezar esse gênero de experiência, desde que se disponha de médiuns adequados e para tanto se organizem sessões especiais, independentes daquelas dedicadas a comunicações morais e filosóficas. Os médiuns poderosos dessa categoria são raros, mas há fenômenos que, embora mais vulgares, não são menos interessantes e concludentes porque provam, de maneira evidente, a independência do médium. Deste número, são as comunicações pela tiptologia alfabética que às vezes dão os mais imprevistos resultados. A teoria desses fenômenos é necessária para que se compreenda a maneira pela qual se operam, pois é raro que levem uma convicção profunda aos que não os compreendem. Ela tem, além disso, a vantagem de dar a conhecer as condições normais em que esses fenômenos podem produzir-se, e, consequentemente, de evitar as tentativas inúteis e de permitir que se descubra a fraude, caso ocorra em qualquer parte. Equivocaram-se supondo que fôssemos sistematicamente contrário às manifestações físicas. Preconizamos e preconizaremos sempre as comunicações inteligentes, sobretudo as que têm alcance moral e filosófico, porque só elas tendem para o objetivo essencial e definitivo do Espiritismo. Quanto às outras, jamais lhes contestamos a utilidade, mas nos levantamos contra o deplorável abuso que delas fazem, ou que podem fazer; contra a exploração feita pelo charlatanismo; contra as más condições em que são realizadas as mais das vezes, e que se prestam ao ridículo. Dissemos e repetimos que as manifestações físicas são o começo da ciência e que não se avança ficando no á-bê-cê; que se o Espiritismo não tivesse saído das mesas girantes, não teria crescido como cresceu, e que talvez hoje nem mais se falasse dele. Eis por que nos esforçamos por fazê-lo entrar na via filosófica, certo de que então, dirigindo-se mais à inteligência do que aos olhos, tocaria o coração e deixaria de ser um modismo. É com esta única condição que poderia fazer a volta ao mundo e implantar-se como doutrina. Ora, o resultado ultrapassou, e de muito, a nossa expectativa. Às manifestações físicas só damos uma importância relativa e não absoluta. Aí está o nosso erro, aos olhos de certas pessoas que delas fazem uma ocupação exclusiva e nada mais veem. Se delas não nos ocupamos pessoalmente é porque nada de novo nos ensinariam e porque temos coisas mais essenciais a fazer. Longe de censurar os que delas se ocupam, ao contrário, encorajamo-los, desde que o façam em condições realmente proveitosas. Sempre que conhecermos reuniões desse gênero, dignas de confiança, seremos os primeiros a recomendá-las à atenção dos novos adeptos. Tal é, sobre esta questão, a nossa profissão de fé categórica. 22. Dissemos no começo que diversas reuniões espíritas pediram para unir-se à Sociedade de Paris. Usaram até a palavra afiliar; a esse respeito faz-se necessária uma explicação. A Sociedade de Paris foi a primeira a constituir-se regular e legalmente. Por sua posição e pela natureza de seus trabalhos, teve uma grande participação no desenvolvimento do Espiritismo e, em nossa opinião, justifica o título de Sociedade Iniciadora, que lhe deram certos Espíritos. Sua influência moral se fez sentir longe e, embora ela seja numericamente restrita, tem consciência de ter feito mais pela propaganda do que se tivesse aberto suas portas ao público. Formou-se com o único objetivo de estudar e aprofundar a Ciência Espírita. Para isto não necessita de um auditório numeroso nem de muitos membros, pois sabe que a verdadeira propaganda é feita pela influência dos princípios. Como não é movida por qualquer interesse material, um excesso numérico lhe seria mais prejudicial que útil. Assim, com satisfação, ela verá multiplicarem-se ao seu redor as reuniões particulares formadas em boas condições, e com as quais poderia estabelecer relações de confraternidade. Ela não seria coerente com seus princípios, nem estaria à altura de sua missão, se pudesse conceber a sombra da inveja; os que a julgam capaz disto não a conhecem. Estas observações bastam para mostrar que a Sociedade de Paris não poderia ter a pretensão de absorver as outras sociedades que se pudessem formar em Paris ou alhures, com os mesmos procedimentos habituais. A palavra afiliação seria, pois, imprópria, porque suporia uma espécie de supremacia material, a que absolutamente não aspira, e que até teria inconvenientes. Como Sociedade iniciadora e central, pode estabelecer com os outros grupos ou Sociedades relações puramente científicas, mas a isto se limita o seu papel. Ela não exerce qualquer controle sobre essas sociedades, que em nada dependem dela e ficam inteiramente livres para constituir-se como bem o entenderem, sem ter que prestar contas a ninguém, e sem que a Sociedade de Paris tenha que imiscuir-se seja no que for em seus negócios. Assim, as sociedades estrangeiras podem formar-se nas mesmas bases; declarar que adotam os mesmos princípios, sem depender dela senão pela concentração dos estudos e pelos conselhos que lhe podem pedir e que ela terá prazer em dar. Por outro lado, a Sociedade de Paris não se gaba de estar, mais que as outras, ao abrigo das vicissitudes. Se, por assim dizer, as tivesse em suas mãos e se, por uma causa qualquer, cessasse de existir, a falta de um ponto de apoio resultaria em perturbação. Os grupos ou Sociedades devem buscar um ponto de apoio mais sólido que numa instituição humana, necessariamente frágil. Eles devem adquirir sua vitalidade nos princípios da doutrina, que são os mesmos para todas e que a todas sobrevivem, estejam ou não esses princípios representados por uma sociedade constituída. 23. Estando claramente definido o papel da Sociedade de Paris para evitar qualquer equívoco ou falsa interpretação, as relações que estabelecerá com as sociedades estrangeiras são extremamente simplificadas, limitando-se a relações morais, científicas e de mútua benevolência, sem qualquer sujeição. Elas permutarão o resultado de suas observações, quer através de publicações, quer de correspondência. Para que a Sociedade de Paris possa estabelecer essas relações, é preciso necessariamente que ela tenha informações exatas das sociedades estrangeiras que entendem marchar pelo mesmo caminho e adotar a mesma bandeira. Ela então as incluirá na lista de seus correspondentes. Se houver vários grupos numa cidade, serão representados pelo grupo central de que falamos no parágrafo 18. 24. Indicaremos agora alguns trabalhos com os quais as diversas Sociedades poderão colaborar de uma maneira útil; mais tarde indicaremos outros. Sabe-se que os Espíritos, não possuindo todos a soberana ciência, podem encarar certos princípios de um ponto de vista pessoal e, consequentemente, nem sempre estarem de acordo. O melhor critério da verdade está naturalmente na concordância dos princípios ensinados sobre diversos pontos, por Espíritos diferentes e por meio de médiuns estranhos uns aos outros. Assim foi composto o Livro dos Espíritos. Mas ainda restam muitas questões importantes que podem ser resolvidas dessa maneira, e cuja solução terá tanto maior autoridade quanto obtida por uma grande maioria. Assim, a Sociedade de Paris poderá ocasionalmente dirigir perguntas dessa natureza a todos os grupos correspondentes que, através de seus médiuns, pedirão a solução a seus guias espirituais. Outro trabalho consiste nas pesquisas bibliográficas. Existe um grande número de obras antigas e modernas, nas quais se encontram testemunhos mais ou menos diretos em favor das ideias espíritas. Uma coletânea desses testemunhos seria tarefa muito preciosa, mas é quase impossível ser feita por uma só pessoa. Torna-se fácil, ao contrário, se cada um se dispuser a colher alguns elementos em suas leituras e estudos e transmiti-los à Sociedade de Paris, que os coordenará. 25. No estado atual das coisas, esta é a única organização possível do Espiritismo. Mais tarde as circunstâncias poderão modificá-la, mas nada se deve fazer de inoportuno. Já é muito que em tão pouco tempo os adeptos se tenham multiplicado a ponto de conduzir a este resultado. Há nesta simples disposição um panorama que pode estender-se ao infinito, pela própria simplicidade das engrenagens. Não busquemos, pois, complicá-las, com receio de encontrar obstáculos. Os que fizerem a gentileza de testemunhar-nos alguma confiança, podem estar certos de que não os deixaremos para trás e que tudo virá a seu tempo. É somente a esses, como dissemos, que nos dirigimos nestas instruções, sem a pretensão de nos impormos aos que não marcham conosco. Para denegrir, disseram que queríamos fazer escola no Espiritismo. E por que não teríamos esse direito? O Sr. de Mirville não tentou fundar uma escola demoníaca? Por que seríamos obrigados a seguir a reboque deste ou daquele? Não temos o direito de ter uma opinião, formulá-la, publicá-la e proclamá-la? Se ela encontra tão numerosos aderentes, é que aparentemente não a julgam destituída de todo senso comum. Mas aí está nosso erro aos olhos de certas pessoas que não nos perdoam por havermos chegado mais rápido que elas, e sobretudo por termos triunfado. Que isto seja então uma escola, já que assim o querem. Para nós será uma glória escrever em sua fachada: Escola do Espiritismo moral, filosófico e cristão. Para ela convidamos todos os que têm por divisa amor e caridade. Aqueles que se ligam a esta bandeira adquirem todas as nossas simpatias, e o nosso concurso jamais faltará. ALLAN KARDEC

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

DIA DE FINADOS?

O Cristianismo é, por excelência, a Doutrina do Espírito, fundada em fatos que demonstram, à evidência, a sua presença e atuação, em qualquer circunstância, sempre que necessário. Seus ensinamentos primam pela tese comprobatória da realidade da existência da alma e de sua dificuldade de entrar em relação conosco, em estado de vigília ou durante o sono, como que a mostrar-nos à saciedade que há entre os dois planos, material e espiritual, corpóreo e incorpóreo, estreito entrosamento. Maria de Nazaré recebe a visita do Anjo Gabriel, que lhe anuncia a maternidade de agraciada do Senhor. José, em se propondo deixar a esposa secretamente, é avisado em sonho de que não faça tal, porque o que nela fora gerado era do Espírito Santo. Isabel, visitada pela gestante eleita, recebe o impacto de poderoso influxo magnético, que faz que a criança - ela também estava para ser mãe -, lhe estremeça no ventre. Os magos visualizam no Oriente uma estrela que os guia em dois estafantes anos de viagem e os conduz, não à gruta mas à casa onde se achavam José e Maria e, de regresso, são “por divina advertência prevenidos em sonho para não voltarem à presença de Herodes”. Em sonho ainda, “eis que aparece um anjo do Senhor a José”, induzindo-o à fuga para o Egito a fim de salvar o menino da sanha sangüinária de Herodes, ordenando-lhe que retornasse à “terra de Israel” e aconselhando-o a que se retirasse “para as regiões da Galiléia”. Uma entidade angelical, na calada da noite, aparece aos pastores dando-lhes a boa nova do Nascimento do Salvador. “Movido pelo Espírito”, Simeão foi ao templo, onde tomou nos braços o Filho de Deus, bendizendo ao Pai pela bênção de tê-Lo visto antes de partir e profetizando acerca do Seu messianato. Ana, a profetiza, mediunizada, “chegando naquela hora, dava graças a Deus, e falava a respeito do menino a todos os que esperavam a redenção de Jerusalém”. Antes do nascimento de Jesus, houve o de João, caracterizado também por manifestações espirituais ostensivas. Quando Zacarias oficiava no templo, “na ordem do seu turno”, surge-lhe um Emissário Celestial que lhe prediz o nascimento do Precursor. No Jordão, ao se processar o batismo de Jesus, uma voz reboa pelo ar, dizendo: - “Este é o meu filho amado, em quem me comprazo.” Este mesmo fenômeno de Pneumatofonia, isto é, de voz direta, repete-se quando da transfiguração do Mestre no Monte Tabor, presentes os Espíritos de Moisés e Elias, profetas da antiga dispensação. Na parábola do rico e Lásaro, infunde-nos Ele a convicção na realidade da comunicação dos Espíritos com os homens, fazendo que Abraão ponderasse ao rico, que queria falar a cinco irmãos seus, ser inútil aparecer-lhes porque eles não lhe dariam crédito e não porque fosse impossível fazer-se-lhes visível para adverti-los. Liberta endemoinhados, cujos Espíritos impuros e obsessores confessam conhecê-Lo e reconhecer-Lhe a autoridade de Filho do Altíssimo. - “Porque buscais entre os mortos ao que vive?” Foi a pergunta que “dois varões com vestes resplandescentes” fizeram às mulheres que levavam aromas e bálsamos para depositar no túmulo de Jesus, cuja pedra encontraram removida, sem o corpo no seu interior. - “O Senhor ressuscitou e já apareceu a Simão! Assim se expressavam os dois discípulos que, a caminho de Emaús, tiveram a companhia do Mestre, com quem confabularam durante toda a viagem e a quem pediram, ao término da jornada: - “Fica conosco, porque é tarde e o dia já declina.” E, na mesma hora, levantando-se, voltaram para Jerusalém onde acharam reunidos os onze e outros com eles. Então os dois contaram o que lhes acontecera no caminho, e como fora por eles reconhecido no partir do pão.” - “Paz seja convosco” - “Porque estais perturbados? e por que sobem dúvidas aos vossos corações?” Foram palavras de Jesus, na Sua primeira aparição aos Discípulos, no Cenáculo de Jerusalém. - “Porque me viste, creste? Bem-aventurados os que não viram e creram.” Outras palavras de Jesus, em Sua segunda aparição aos Discípulos, dirigidas especialmente a Tomé, que, por não estar presente na primeira, não dera crédito à versão divulgada pelos seus companheiros, de que o Senhor lhes aparecera. “Depois disto, tornou Jesus a manifestar-se aos Discípulos junto do mar de Tiberíades”, onde se desenrolam acontecimentos de assinalada importância que culminam com o famoso diálogo entre Ele e Simão Pedro, o Pescador de Cafarnaum. Finalmente, apareceu o Nazareno, ao monte, aos quinhentos da Galiléia, a quem endereça, pela última vez, a Sua Palavra de Vida Eterna, após o que ocorre a Ascensão definitiva. Isto sem falar de aparições, no cenário de Jerusalém, a Maria Madalena, a Maria de Nazaré, em Éfeso, na casa de João Evangelista; a Pedro, por algumas vezes; a Saulo de Tarso, às portas de Damasco. Onde, em tudo isso, a idéia de morte? Antes não ressumbra, de todos esses sucessos, a noção de “vida abundante”, de pensamento e ação por parte daqueles que formam o mundo incorpóreo? O Espiritismo, que se funda estruturalmente no Cristianismo, cuja pureza primitiva restaura em toda a plenitude, desfralda também a bandeira da imortalidade da alma, de eternidade do ser no Infinito do Tempo e do Espaço. Não há mortos e vivos, nem do lado de lá, nem do lado de cá, embora possa haver, tanto num quando noutro plano, mortos-vivos e vivos-mortos. Ninguém vai, ninguém fica, apenas alguns chegam e outros voltam, na longa caminhada de poder subir para saber descer, ajudando os outros a fim de ajudar-se a si próprio. A mediunidade, disciplinada espiriticamente, nos descortinou novas dimensões de vida, revelando ao mundo a existência de outros mundos e à Humanidade a presença de outras Humanidades disseminadas no turbilhão de astros que gravitam nos arcanos do Universo. 2 de Novembro... Como os demais, dia de todos nós, encarnados e desencarnados, que buscamos na Terra ou na Erraticidade os valores do Espírito, a gloriosa realização de nós mesmos em Deus, libertos e purificados por todo o sempre, para empunharmos na destra a palma da vitória e cingirmos à frente a coroa de louros de almas redimidas e ressurrectas, integradas nas sublimes claridades dos cimos. Passos Lírio Pág. 333 Reformador (FEB), Novembro 1993