Um Mundo
Novo, Humanizado
Antes de pretender ganhar os céus, o homem precisa compreender o seu papel na Terra diante do seu semelhante e em relação a si mesmo. Antes de espiritualizar-se propriamente, precisa humanizar-se, tornar-se mais humano.
Tem-se falado muito no processo de regeneração da
humanidade que, segundo instruções dos Espíritos a Allan Kardec, já teria se
iniciado. Entre os espíritas criou-se um clima generalizado de expectativa
(meio místico) no que se refere aos “tempos chegados”, como se esse período de
renovação tivesse data para acontecer.
Toda a longa trajetória evolutiva do homem até
chegar à sua atual concepção físico-psíquica não foi suficiente para
transformá-lo significativamente, a ponto de não se poder mais compará-lo, em
nenhuma de suas ações, aos seus antepassados primitivos.
Claro que há grande distância separando o homem de
hoje do que ele foi há remotas eras. Mas o atavismo do longínquo passado traz
ainda à tona, em várias circunstâncias, muito da sua natureza bruta, que se
pode observar em surpreendentes atos de agressividade, violência e
inconsequência. E, infelizmente, esse não é um fenômeno isolado, pois ocorre
ainda em muitas partes do planeta.
O Espírito Lázaro fala dessa situação em “O
Evangelho segundo o Espiritismo” quando afirma estar o homem “mais próximo do
ponto de partida que do alvo”, (1) quando dominado pelos instintos.
Por outro lado, basta olhar a civilização moderna
para constatar que o homem evoluiu bastante, transformou o mundo, viajou no espaço,
desenvolveu a inteligência a níveis espantosos. Fez progredir também seus
hábitos e costumes sociais polindo-os e dando-lhes uma feição que os distancia
da barbárie. Entretanto, seus avanços no campo ético-moral foram bem mais
discretos, confirmando as explicações dadas pelos Espíritos da codificação de
que o progresso moral não acompanha, no mesmo ritmo, o avanço da inteligência
(2). É essa discrepância a causa do desequilíbrio que se constata atualmente no
mundo. “Resta-lhes (aos homens) ainda um imenso progresso a realizar: é o de
fazer reinar entre eles a caridade, a fraternidade e a solidariedade, para
assegurar o bem-estar moral” (3).
Segundo os mesmos Espíritos, um projeto de
renovação moral está em andamento na Terra, envolvendo expurgo, exílio para
mundos primitivos daqueles que “praticam o mal pelo mal, e que o sentimento do
bem não atinge” (...); “irão expiar seu endurecimento, uns nos mundos
inferiores, outros em raças terrestres atrasadas, que serão o equivalente a
mundos inferiores” (...) (4).
Considerando-se que Deus é justo e seus mecanismos
de justiça sabem ler o que se passa em cada consciência; considerando-se que os
seres efetivamente maus (grifo meu) são uma minoria audaciosa, conforme sugere
a questão 932 de “O Livro dos Espíritos”, e estes deverão abandonar a Terra;
considerando-se ainda que o número de Espíritos infantis, ingênuos, indolentes,
indiferentes, mas sem maldade (as “almas frágeis” de que fala Herculano Pires
no livro “O centro espírita”) são boa parte de nossa humanidade e talvez devam
ficar por aqui, conclui-se que estes últimos (os “sem maldade”), juntamente com
uma ínfima parcela de Espíritos terrestres mais adiantados, participarão do
processo de humanização do planeta.
A tarefa de reequilibrar a vida planetária caberá,
então, à maioria dos Espíritos que pertencem à terceira ordem da escala
espírita (Espíritos imperfeitos), somada à pequena porção que já adentra à
segunda ordem (Espíritos bons), e ainda àqueles que, vindos de mundos mais
avançados, reencarnarão em substituição gradual aos exilados. Sem os Espíritos
radicais do mal, começará a se desenhar aqui um novo tempo, cujos signos serão
o respeito entre os homens e a implantação da vida pacífica, conforme muito bem
esclarece todo o capítulo XVIII de “A Gênese”.
Compreende-se, assim, que apesar de ter-se iniciado
há mais de um século, a renovação não se dará de uma hora para outra, e que os
homens terão muito trabalho pela frente. Porém, com a paulatina mudança de
ares, o ambiente da Terra será mais propício à transformação. É aí que “o
Espiritismo, mais que qualquer outra doutrina, está apto a secundar o movimento
regenerador” (5).
O que o bom senso pede é que continuemos lutando
sem desânimo, individual e coletivamente, pelo estabelecimento desse novo estágio
entre nós, mas sem as expectativas angustiosas quanto ao tempo, pois “como a
natureza não dá saltos” e milagres não existem, os que ficarem precisarão
construir esse mundo novo, e essa tarefa levará tempo. Ainda em “A Gênese”, no
mesmo texto de Allan Kardec podemos ler: “No dizer dos Espíritos (...) tudo se
passará exteriormente como de costume, com esta única diferença, porém
diferença capital, que uma parte dos Espíritos que aí se encarnam não mais se
encarnará”.
Claudio Bueno da Silva
Notas:
(1) “A lei de amor”, capítulo XI.
(2) “O Livro dos Espíritos”, questão 780.
(3 e 5) “Sinais dos tempos”, capítulo XVIII de “A Gênese”, Allan Kardec, Ed. LAKE.
(4) “A nova geração”, capítulo XVIII de “A Gênese”, Allan Kardec, Ed. LAKE.
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