Por Sérgio Ribeiro
Kardec, sempre inspirado pelo Espírito de
Verdade, na sua vasta obra, jamais considerou o espiritismo como uma religião.
E dizemos mesmo que existiu uma simbiose
psíquica perfeita com o Espírito de Verdade, como poderemos ver nas suas «Obras Póstumas», na
mensagem dos Espíritos de Setembro de 1863, onde podere
mos ler: «...” teu cérebro
apreende as nossas inspirações com a facilidade com que tu mesmo as percebes. A
nossa atuação, principalmente a do Espírito de Verdade, é constante sobre ti e
é tal que dela não podes esquivar-te.» O Espírito de Verdade e o Codificador
estavam demasiado conscientes dos graves prejuízos que as religiões realizaram
na sociedade ao longo dos séculos. A carga psicológica negativa que exerciam na
consciência das criaturas era demasiado pesada, escravizava as consciências em
lugar de libertá-las.
As religiões estavam
associadas à intolerância, à dominação e ao proselitismo que levou a muitas
violências no esforço de impor aos outros as suas convicções, os seus dogmas de
fé; estavam indelevelmente ligadas ao obscurantismo, aos privilégios (a
«graça»), ao sobrenatural, ao milagre como derrogação das leis de Deus, às
hierarquias sacerdotais que se arrogavam de representantes de Deus na Terra
(sempre o «poder»); estavam impregnadas de rituais e outras práticas, quase
sempre de carácter exterior; etc.
Todas essas crenças, práticas
e estruturas são incompatíveis com a nova doutrina que é profundamente simples,
racional e tolerante e que nos diz que a «Fé inabalável é somente aquela que
pode encarar a razão, face a face, em todas as épocas da humanidade».
Allan Kardec, cinco meses
antes do seu passamento, proferiu na Sociedade Espírita de Paris um discurso em
que nos disse por que razão o Espiritismo não é uma nova religião. Desse
discurso, que se poderá ler integralmente na «Revue», extraímos o seguinte
extrato:
«Por que, então, declaramos
que o Espiritismo não é uma religião?”.”.”.”. Porque não há uma palavra para
exprimir duas ideias diferentes, e que, na opinião geral, a palavra religião é
inseparável da de culto; desperta exclusivamente uma ideia de forma, que o
Espiritismo não tem. Se o Espiritismo se dissesse uma religião, o público não
veria aí senão uma nova edição, uma variante, se quiser, dos princípios
absolutos em matéria de fé; uma casta sacerdotal com seu cortejo de
hierarquias, de cerimónias e privilégios; não separaria das ideias de misticismo
e dos abusos contra os quais tantas vezes se levantou a opinião pública.
Não tendo o Espiritismo
nenhum dos caracteres de uma religião, na acepção usual do vocábulo, não podia
nem devia enfeitar-se com o título sobre cujo valor inevitavelmente se teria
equivocado. Eis porque simplesmente se diz: doutrina filosófica e moral.».
Nas suas «Obras Póstumas»,
Kardec diz-nos o seguinte: «O Espiritismo é uma doutrina filosófica
espiritualista. Por isso toca forçosamente nas bases fundamentais de todas as
religiões: Deus, a alma e a vida futura. Mas não é uma religião constituída,
visto não ter nem culto, nem rito, nem templo e, entre os seus adeptos, nenhum
recebeu o título de sacerdote ou grão-sacerdote.».
E mais, diz-nos que o
Espiritismo não é incompatível com a ciência, o que não acontece com as
religiões: «O Espiritismo marcha de acordo com a Ciência no terreno da matéria:
admite todas as verdades que ela comprova, mas onde terminam as investigações
desta, prossegue as suas no terreno da espiritualidade.».
Destas afirmações do
Codificador — tornamos a frisar, sempre escoradas no Espírito de Verdade que
nunca o deixou de inspirar na sua missão, como já vimos — podemos entender em
definitivo porque o Espiritismo não é mais uma religião e nem o centro espírita
um templo religioso, mas sim a casa onde estudamos a doutrina espírita; onde
socorremos os doentes da alma, exercitando assim a fraternidade; onde
exercitamos a mediunidade de forma responsável, nomeadamente a serviço fraterno
dos espíritos materializados e sofredores que necessitam ainda da palavra e
ambientes humanos, para serem esclarecidos e amparados; onde, também,
aprendemos a orar.
O Centro Espírita é a escola
e o hospital da alma, ao mesmo tempo. O espírito Emmanuel diz-nos que «É a
Universidade da alma, onde as lições de Jesus estão empenhadas em nossas
mãos.».
Extrato do trabalho
«Espiritismo: religião futura ou futuro das religiões», apresentado no II
Congresso Nacional de Espiritismo
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